sexta-feira, 12 de julho de 2019

Cabrochas sergipanas

As moças da Maranduba

Por Sálvio Siqueira
Foto com as cangaceiras Àurea e Rosinha (Irmã de Adelaide).
                                                    
Na fazenda Maranduba, fincada no município de Poço Redondo, Estado sergipano, morava o casal Lé e Pureza. Lé, como tantos outros homens da época, era vaqueiro, assim como seus dois irmãos, Josias e Luiz. Pureza era filha do agricultor João Januário, que manipulava sua enxada nos barros da localidade Curralinho.
 
 Umbuzeiro da Fazenda Maranduba - grupo LCN
                     
O casal, cumprindo a “Lei’ escrita no livro Maior, fez com que crescesse e multiplicasse sua prole. Tiveram seis filhos amados. Criados como todos da região, com muita dificuldade e sacrifício. Segundo a obra literária do ilustre Alcino Alves Costa, “LAMPIÃO ALÉM DA VERSÃO – MENTIRAS E MISTÉRIOS DE ANGICO”, na página 137, ‘Ele’ nos relata que os nomes dos amados filhos do casal Lé e Pureza, eram Adelaide, Rosinha, Cidália, Arabela e seu único filho homem, Zequinha.

                                                   
Zequinha, como tantos, só via-se como adulto, quando 'lá' chegasse, um bom vaqueiro, imitando seu velho pai e tios, pois todos eram afamados vaqueiros em toda aquela região.


As meninas, também como tantas da época, tinham em seus sonhos seus ‘príncipes, encantados, seria querer de mais, mesmo, simplesmente um príncipe, já estava de bom tamanho. A vida era dura para os meninos que logo, logo, tinham que exercerem funções de adultos sem nem mesmo passarem, ou melhor, viverem suas adolescência. Para as meninas a coisa era mais dura ainda. Não podiam, muitas das vezes, nem se quer estudaram, para não ficarem sabidas, pois mulher ‘sabida’ era um perigo.

                                                               Cangaceira Rosinha

Naquele tempo, por aquelas bandas, começaram a circularem em volta da casa de Lé dois cangaceiros. Mariano e Criança. O Primeiro, após perder Otília, apaixona-se por Rosinha. O segundo, há muito estava loucamente apaixonado por Adelaide, irmã de Rosinha.

Sendo, na época quem dava as ‘cartas’ por aquelas terras, os dois cangaceiros não tiveram dificuldades de levarem para as tristes fileiras do cangaço as irmãs. Ficaram distantes por os dois atuarem em grupos e áreas diferentes. Mariano vivia e praticava seus crimes pras bandas de Porto da folha. Já Criança, atuava nas redondezas de Poço Redondo.


E o esperado acontece. Adelaide engravida. Sua gravidez, como de todas as outras mulheres que fizeram parte do cangaço, não foi moleza. Levanta daqui, corre pra li, debaixo de sol e chuva, durante o dia ou mesmo a noite, eram uma constante em suas vidas.
                                                                                   Cangaceiro Mariano
                                                     
Segundo a obra citada, Criança tem grande amor e carinho por Adelaide, resultando firmeza e lealdade para com a sua companheira.

Quando aproxima-se o momento da sua companheira parir, Criança, conversa com Mané Moreno, e vão para um coito, distante, conhecido e aconchegante, se podermos dizer que haviam coitos assim, para que Adelaide ‘ganhasse seu filho.
                                                                 Cangaceiro Criança
As horas passam, as contrações há muito iniciaram-se e, com o passar do tempo, seu retorno começa a ficar quase sem intervalos. Não tem jeito. A criança do Criança não vem ao mundo, e sua companheira já tem bastante tempo que sofre.

Mandam buscar uma parteira que morava nas imediações, e esta, já prevendo complicações, já trás outra para lhe ajudar. Tudo em vão. O sofrimento da cangaceira aumenta com o passar das horas e a criança resolveu não vir ao mundo.


Em uma rede, a transportam para uma localidade que tivesse algum recurso como ajuda, nada. Não tem como parir a companheira de Criança.

Valendo-se novamente da rede, os cangaceiros procuram outro lugar para que Adelaide desse a luz... Um local que tivesse uma pessoa para ajudar, terminando assim com tão longo sofrimento. No caminho, alguém verifica e diz que o feto já está morto... Adelaide, de tanto sofrer, talvez não tenha escutado que seu filho estava sem vida em seu ventre. 

Embaixo de uma frondosa árvore, Adelaide, dentro da rede começa a perder suas, já tão fracas, forças... Criança, percebendo que irá perder sua amada fica louco. Grita, chora, fala, urra palavrões na tentativa de amenizar a angústia que lhe invade... Seu ‘compadre’, Mané Moreno, vendo que o amigo estava em estado complexo, sem noção do que fazia, tenta evitar uma catástrofe maior, retirando o ferrolho do mosquetão do amigo, assim como retira também, o carregador da sua pistola.

 Sua amada dá seu último suspiro. Sem despedir-se do companheiro, parte para o outro ‘lado’, onde, talvez, seu filho a esperasse. Fazem seu enterro. A dor, ainda visível no semblante do cangaceiro, não quer ir-se. Naquela vida não havia tempo pra isso... Guardar dores e sentimentos por alguém que tenha morrido.
                                                         Cangaceiro Mané Moreno

Seu compadre, Mané Moreno, compra várias garrafas de aguardente e diz que ele precisa beber até embriagar-se, para esquecer o que aconteceu.


Assim faz Criança. Após o enterro de Adelaide, ele toma um dos maiores porres de sua vida e, de certo tempo pra frente, junto aos companheiros, começam a dançar e cantar até que o dia raiasse... Nas quebradas do Sertão.

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