Poetas Lucarocas, Audífax Rios e Barros Alves
Antônio Vicente Mendes Maciel, o lendário místico quixeramobinense que exerceu apocalíptica pregação nos sertões da Bahia, ao contrário do que muitos imaginam, não era um iletrado. O Historiador João Brígido, contemporâneo daquele visionário que inscreveu o nome na história-pátria como Antônio Conselheiro, informa que ele cursara rudimentos de Latim com o Professor Antônio Ferreira Nobre, na terra natal. A formação escolar constara também de estudos da Língua Portuguesa, Aritmética, Geografia e Francês.
O Conselheiro, desde jovem propenso ao eremitismo, propensão esta que se exacerbou em razão de desilusão amorosa, era leitor da Bíblia, do "Lunário Perpétuo", das "Horas Marianas" e das "Práticas Mandamentais", livros sacros cuja leitura era piedosamente feita por quase todos os letrados católicos que habitavam os sertões nordestinos no século XIX. De par com essas leituras, durante quatro anos, Antônio Vicente Mendes Maciel acompanhou o Pe. Ibiapina, ex-advogado e orador fluente, que se tornara padre e missionário a construir hospitais, casas de caridade e cemitérios nos mais adustos lugarejos do Nordeste brasileiro. Há de se aceitar que de Ibiapina o futuro "Conselheiro" recebeu profunda influência, tornando-se ele próprio, além de construtor de igrejas e cemitérios, um orador exaltado e convincente, cujo discurso messiânico foi apreendido com fervor por milhares de seguidores.
Não apenas no púlpito ou em conferências particulares, sabia o Conselheiro admoestar e convencer com autoridade. Ao escrever ele conseguia expressar suas estranhas ideias com clareza e precisão, deixando explícito seu antirrepublicanismo nos "Discursos sobre a República", assim como orientações de caráter anticlerical nas "Prédicas Canudenses". O Conselheiro "escrevia muito", conforme depoimento dado ao historiador José Calasans por Pedro Nolasco, o Pedrão, um dos pretorianos da guarda pessoal de Antônio Conselheiro. E a escritura dele era "normal, límpida e de pessoa letrada", segundo o testemunho de Gustavo Barroso.
Caído o arraial de Canudos sob o fogo raivoso de 5 mil soldados, foram encontrados dois textos manuscritos assinados pelo "Peregrino" Antônio Vicente Mendes Maciel - ele não se autointitulava "Conselheiro" -, os quais se subordinavam aos seguintes títulos: "Tempestades que se Levantam no Coração de Maria por Ocasião do Mistério da Anunciação" (Belo Monte, 12.01.1897) e "Sobre o Santo Evangelho de Jesus e Apontamentos dos Preceitos da Divina Lei de Nosso Senhor Jesus Cristo". Nesses trabalhos, o Conselheiro apresenta sua cosmovisão do mundo, especialmente no respeitante à Política e à Religião.
Quanto à oratória do místico rebelde, diz-se que era "seca e rígida no que diz respeito ao homem nas suas relações com o sagrado". Na apreciação do Professor Bartolomeu de Sousa Mendes, autor de importante obra sobre o tema, foi exatamente esse aspecto real da oratória do Conselheiro "que apavorou as autoridades e os detentores do poder econômico da época, mas por outro lado, atraiu para sua órbita a grande massa da população que vivia subjugada a um sistema oligárquico e perverso". Com efeito, foi graças à sua oratória que o Conselheiro conseguiu transmitir de maneira convincente suas mensagens de justiça e condenação dos desmantelos do mundo, não apenas aos milhares de sertanejos incultos, mas também a algumas personalidades letradas, conseguindo destes um devotamento que persistiu até o último momento, quando Canudos caiu, a 5 de outubro de 1897, 12 dias depois da morte do cenobita revolucionário. Todavia, como bem disse Euclides da Cunha no clássico "Os Sertões": "Canudos caiu, mas não se rendeu".
Nade no açude de: Cumpadi Barros Alves
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