terça-feira, 22 de novembro de 2022

A vida após o cangaço

 João Maria e Zé Rufino?

 Por Moisés Reis

Em carta escrita pelo padre Renato Galvão no dia 4 de outubro de 1954 endereçada ao deputado João da Costa Pinto Dantas, encontramos o curioso dia em que João Maria de Oliveira, adversário político do padre naquela ocasião, quase precisou se entender com o famoso matador de cangaceiros, o tenente José Osório de Farias, conhecido com Zé Rufino.

 

 Zé Rufino, em imagem de Thomas Farkas

Coronel João Maria de Carvalho
 

Para entender o contexto, é preciso lembrar que naquele ano (1954) o cangaço já havia acabado e Zé Rufino gozava de enorme prestígio pelos seus feitos durante os tempos do combate ao banditismo. Naquela data, acontecia a eleição para prefeito de Cícero Dantas, pleito vencido por João Batista de Andrade Souza, da UDN com 1374 votos, e a seção eleitoral de Fátima, que funcionava no atual Colégio Estadual N. S de Fátima, era famosa pelas confusões entre os grupos políticos rivais.

Sabendo disso, o Padre Renato buscou se precaver e solicitou junto às autoridades a presença de ninguém menos que Zé Rufino, a fim de garantir que os trabalhos corressem dentro da normalidade.

Acontece que o famoso oficial, por alguma razão, não atendeu ao chamado do Padre e a problemática seção eleitoral ficou sem a autoridade policial desejada pelo vigário.

 


O que se segue, de acordo com o relato do religioso na dita carta é um caos promovido pelo então soldado João Maria e um certo subdelegado João Neves. Ainda de acordo com o relato da carta, Dona Ludi era a presidente da mesa e João Maria teria usado isso em seu favor, coagindo eleitores adversários e espalhando boatos de pânico provocado o retorno antecipado de eleitores que não votaram. 

Eram 600 votantes naquela seção que, devido aos contratempos provocados por João Maria e o Subdelegado, tiveram apenas três horas para concluírem a votação em cédula da época o que, naturalmente, provocou alta abstenção em uma seção que tinha muito mais votos para o candidato do Padre. Diante disso, O vigário finaliza a carta pedindo a intervenção do deputado no sentido de anular a votação e realizar novo pleito.

O fato a ser registrado aqui é um quase encontro entre a mais famosa liderança política de Fátima e um personagem importante da história do cangaço. Encontro que só não aconteceu (ao menos não dessa vez) pela ausência de Zé Rufino.

Obviamente esse texto não visa atacar a imagem de nenhum dos personagens envolvidos nessa história, o que busco, tão somente, é trazer o relato aos leitores do blog e deixar o registro de mais um episódio da nossa história. 


Pescado em Blog História de Fátima

sábado, 12 de novembro de 2022

Gleuse Ferreira

Bisneta de Lampião e Maria Bonita lidera novo 'bando' da família

Por Claudia Castelo Branco TAB, UOL

Paulo Serdan, 55, presidente da Mancha Verde, foi pego de surpresa quando advogados o procuraram num dia de julho. Eram representantes da família Ferreira — a família de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e Maria Gomes de Oliveira, a Maria Bonita.

No Carnaval de 2023, a agremiação paulista, atual campeã, vai levar à avenida o desfile "Oxente: sou xaxado, sou Nordeste, sou Brasil", que revisita tradições do sertão nordestino, onde nasceu o xaxado, dança do cangaço na qual a espingarda marcava o ritmo da pisada — o nome vem do barulho das alpercatas, o xa-xa, na areia. O que a Mancha Verde não sabia é que a única filha de Lampião e Maria Bonita, Expedita, 90, está viva.

A conversa com os advogados foi amigável, visto que o desfile tem caráter cultural, não comercial. "É nossa família. Nós só queremos ser protagonistas também", diz a arquiteta Gleuse Ferreira Nunes de Oliveira, 41, bisneta do casal que liderou o cangaço. Gleuse tem viajado de Aracaju, onde mora, para São Paulo. Num domingo de novembro, ela chegou ao barracão da Mancha Verde no Bom Retiro carregando Bento, um chihuahua enfeitado com lenço no pescoço.

Gleuse Ferreira, bisneta de Lampião e Maria Bonita, 
no barracão da Mancha Verde, em São Paulo.

"Muita gente não sabe que existimos. Ou pensam que a gente tá lá no sertão, no meio do mato", conta, enquanto observa a estrutura de um Lampião gigante. "É esse aqui o meu?", pergunta — a convite da escola, a arquiteta será responsável pela decoração de um dos carros.

A família Ferreira é pequena, formada por mulheres animadas, aposentadas, viúvas ou solteiras — "o segredo da felicidade", segundo Expedita. Ela é mãe de Iza, Gleuse, Vera e Deja. Gleuse, 66, decidiu batizar a filha caçula, a arquiteta, com o próprio nome; e também é mãe de Karla, 43, que mora em Londres. "E a gente só anda agarrada, é uma folia", dizem. Certa vez, o marido de Expedita foi para o hospital, e um dos médicos não gostou de ver o quarto lotado de visitas. Vera, 67, logo reagiu: "Olha, a gente veio de um bando e vamos continuar em bando aqui dentro".

 

'É nossa família. Nós só queremos ser protagonistas também', diz Gleuse Ferreira  

Imagem: Pryscilla K./UOL.

Outros Carnavais

Ao contrário de cangaceiros nobres do passado, os Ferreira não eram proprietários de terra e não tinham finanças fora do cangaço. Após a morte dos pais, na grota do Angico (SE), Expedita recebeu de herança uma mecha de cabelo de Lampião, morto em 1938. Passou anos escondida e com medo, tanto que o sobrenome só foi para sua certidão em 2016. O olhar torto ao bando de Lampião mudou na década de 1980, quando se iniciou uma nova leitura da trajetória do cangaço. Hoje, o acervo da família vem sendo trabalhado também sob nova perspectiva. Vera lembra até hoje de uma viagem para São Paulo que fez na adolescência, com a mãe e a historiadora Marta Machado, e encontrou ex-cangaceiros. Todos levantaram-se em respeito à Expedita, o que a fez pensar que o avô não era o vilão que sempre ouviu dizer. Decidiu então ir viver no sertão, em busca de respostas.

 

O 'bando' da arquiteta Gleuse Ferreira: a mãe Gleuse, a bisavó Expedita, a tia Iza e a prima Luana. Imagem: Pryscilla K./UOL.

 

No livro "Lampião e Maria Bonita - uma história de amor e balas", o jornalista Wagner Gutierrez Barreira conta que os antigos cabras de Lampião se renderam em acordos com a polícia, outros abandonaram o cangaço, fugiram ou simplesmente tocaram a vida. A maioria cumpriu pena e muitos receberam indulto nos anos 1950. 

Na prisão, ganharam fama de tranquilos e alegres. "Quem entrava pro cangaço entrava com um sentimento de Justiça", observa Gleuse Ferreira, a bisneta. Diversas versões ficaram famosas sobre o que foi o bando, com relatos e informações contraditórias — muitas delas, fictícias. "[Lampião e Maria Bonita] são personagens que ultrapassam a própria realidade", comenta o carnavalesco André Machado, 37, exibindo entre suas referências para o Carnaval o livro "Bonita Maria do Capitão", de Vera Ferreira, a neta. De herói a vilão, há de tudo no imaginário ao redor de Lampião, incluindo um livro que diz que o sertanejo era gay. Também há controvérsias sobre a origem do apelido de Maria Bonita, mas é fato que foi no semiárido nordestino que Virgulino encontrou Maria de Déa, recém-separada, que abandonou tudo para seguir o amor de sua vida.

 

Bastidores do barracão da Mancha Verde para o Carnaval de 2023.


Viva o Nordeste


 "O Nordeste merece ser celebrado", comenta Paolo Bianchi, 47, diretor de Carnaval da Mancha Verde, que lembra do primeiro encontro entre as Ferreira e a diretoria no dia 7 de setembro. Parecia que já se conheciam há muito tempo. "Elas perceberam que a Mancha é uma família e sentiram-se acolhidas. Porque também existe um preconceito com escola de samba, a nossa que é vinculada a uma torcida, então?" 


Para o desfile, a arquiteta levará referências de Piranhas, no sertão de Alagoas, onde as cabeças de Lampião e companhia foram expostas pela primeira vez. A Imperatriz Leopoldinense, no Rio de Janeiro, é outra escola que levará à avenida (no caso, a Sapucaí) um enredo sobre "visões delirantes dos cordéis nordestinos que contam histórias fantásticas sobre a chegada de Lampião ao céu e ao inferno".

Imagem: Pryscilla K./UOL.


 Entre Rio e São Paulo, o bando estará muito à vontade na caatinga entre xique-xiques, mandacarus e facheiros cenográficos. "O Carnaval é uma coisa gigantesca, vejo como oportunidade para as pessoas conhecerem minha avó", afirma Gleuse, que confessa ficar incomodada ao ouvir que muita gente desconhece que Expedita existe. A família palpita, principalmente Vera. Ela logo apontou que os tons terra não eram muito usados pelos cangaceiros, que preferiam azul. "Tinha muita coisa colorida. Muitos lenços. Os bornais [bolsas carregadas no corpo] eram todos decorados. Tem gente que fala que o 'biso' foi o estilista, mas não foi. Foi Dadá [companheira do cangaceiro Corisco]. Todo mundo era muito enfeitado. Muitos brincos, anéis, colar", diz Gleuse.

 

Imagem: Pryscilla K./UOL.

 

Além das escolas de samba, o advogado da família, Alex Ferreira, 32, conversou com estúdios que estão com novos projetos envolvendo Lampião e Maria Bonita — entre eles, uma série documental. Eles também não sabiam que a família existia. "Existem. São mulheres de classe média, esclarecidas e que moram em Aracaju. Nós reforçamos isso nas conversas. Não para impedir, mas para proteger os interesses da família.".

Gleuse, que vem estudando licenciamento, defende que atividades assim devem ser impulsionadas, mas muitas empresas já utilizaram comercialmente a imagem do casal sem nunca procurá-las. Desde março, o escritório Cândido Dortas, de Aracaju, representa as Ferreira. Há cerca de um mês, elas conseguiram a autorização do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) para comercializar a marca da família, liderada pela bisneta. "Devem achar que ando por aí vestida de Maria Bonita ou com um facão no bolso", brinca.

A história de Lampião e Maria Bonita continua viva, mas entre as Ferreira paira uma preocupação sobre a continuidade da família: nenhuma das três bisnetas tem filhos. "Se acabar, acabou. Pronto", diz Expedita, bastante pragmática. Na verdade, hoje ela está mais preocupada em aprender o samba-enredo da Mancha Verde para 2023.

 

 'O Nordeste merece ser celebrado', afirma Paolo Bianchi, diretor de Carnaval da Mancha Verde Imagem: Pryscilla K./UOL.

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Cangaceiros

João ´Coxó´

 

O cangaceiro "João Coxó", preso no ano de 1935 no local conhecido por "Brejão". Foi detido por membros da força volante de Garanhuns(PE), após um assalto cometido pelo bando de Lampião no povoado "Serrinha". 



Foto retirada do jornal Diário da Manhã(PE) - Edição de 04 de Agosto de 1935.

Créditos: Guilherme Velame Wenzinger

terça-feira, 1 de novembro de 2022

O LAMPIÃO ACESO RECOMENDA

Luma Hollanda apresenta seu mais novo rebento: "Lugares de Memória" do Cangaço
 

Assim como todo muçulmano precisa um dia ir a Meca, todo ´Cangaceirologo´ precisa um dia ir ao Angico; a Maranduba, a Malhada Caiçara, a Passagem das Pedras, a Patu e especialmente aos primeiros cenários do cangaço, que foram reunidos em um só trabalho pela pesquisadora e escritora pernambucana Luma Hollanda.


 


Este livro, primeiro escrito sobre o tema, apresenta a proposta geral, da constituição de uma memória coletiva do Cangaço e por meio de políticas de preservação, implementar literalmente os possíveis "Lugares de Memória" do Cangaço - Recortes geo-históricos do sertão nordestino.

 
Como recorte espacial, foram pesquisadas as cidades de nascimento e morte do cangaceiro Jesuíno Alves de Melo Calado, o “Jesuíno Brilhante” (1844-1879); do pórtico da cidade de Patu; da antiga cadeia pública de Pombal; do Memorial da Resistência à Lampião e do Museu Lauro da Escóssia, estes últimos situados na cidade de Mossoró/RN, dentre outros, os quais servem de locais de visitação e turismo.


Enfatiza, ainda, em sua valiosa obra, uma correlação de pensamentos entre os escritores Rui Facó e o Eric Hobsbawn, os quais possuem pontos confluentes sobre o banditismo social, alicerçado no meio rural, primitivamente.


O livro conta com 177 páginas e 35 fotos coloridas, algumas identificadas como possíveis "Lugares de Memória".

                                  

Está sendo vendido com valor promocional de pré-lançamento até 04/11: R$ 60 (sessenta reais) com frete incluso. 📲 Contatos p/ aquisição: (83) 99684-1036 / (83) 98230 7108.


 

Luma Hollanda é Conselheira Consultiva do Seminário Cariri Cangaço, Sócia da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) coautora do livro “Nas Trilhas do cangaço de Jesuíno Brilhante” (2013) e “Histórias do Baú da Vovó”.