quarta-feira, 29 de julho de 2009

Opinião

Cangaço - A eterna resistência
 

Hoje na comunidade Grande Rei do Cangaço tivemos o prazer de contar com a participação da jovem Carla Alberto (Foto) que no tópico sobre os 71 anos da morte de Virgulino nos brindou com seu ponto de vista.


Quero começar minha pequena dissertação, afirmando que detesto radicalismo, principalmente no que tange a minha cultura, isto é nordestina.

Estive em Salamanca em 2006 e conversando com um professor Doutor da universidade de Salamanca formado em ciências sociais, presenciei o interesse dele na nossa cultura mais precisamente na questão do cangaço.

Dizia ele, que na visão o Cangaço é um movimento social onde retrata fielmente a dicotomia econômica, social e política entre sul e nordeste do Brasil, jamais (palavras dele) estaria o cangaço inserido no banditismo. Mais infelizmente não é o que presencio aqui na minha terra.

Entender o cangaço e voltar ao tempo, e se aprofundar no projeto colonial português de escravidão e desigualdade, é entender o latifúndio e as grandes navegações que viam no novo continente a exploração e o genocídio.

Dizer que Lampião era cruel, parece piada no pais que na guerra do Paraguai dizimou 99% da população masculina de bala e de degola. Temos ai o surgimento do “nordeste” como traço cultural a valentia do sertanejo, a coragem, a boa hospitalidade, etc.. Gilberto Freire orienta dessa forma na historiografia.

Presenciamos em todos os cangaceiros, não somente Lampião, uma religiosidade ainda envolta no projeto colonial português, a católica, plena de santos e milagres. Entender o cangaço e todos os movimentos daquele recorte temporal e estudar a política na esfera nacional dos primeiros momentos da Republica Velha e inicio da Nova Republica a patente de coronel dada a Lampião foi um regalo de Vargas. Coronel significava a um comando municipal ou regional, uma condecoração na verdade, herança cruel da guarda nacional ainda no Império.

Antes da era Vargas, o coronel era o senhor da vida e da morte, após a era Vargas temos o coronel de prestigio e assistencialista conduzindo seu reduto, através do respeito e poder. Esses mesmos coronéis com o apoio sempre da esfera federal, era que movidos por interesse protegiam o cangaço através de troca de favores e proteção. O Cangaço vingança nada mais é que um grito, um socorro de uma população relegada ao sofrimento de uma pobreza que até hoje serve de curral eleitoral para muitos políticos.

Olho para a História nunca com os olhos da justiça (que desde o período colonial é equivocadamente cega), olho como historiadora, como nordestina, tendo muito orgulho dos ciclos e lutas que acompanharam o povo sertanejo, a historia invisível é o que decididamente me interessa.

Não conto uma história branca e elitizada (aquela ainda dos cronistas portugueses a época do “achamento” do Brasil), conto a historia do povo, aquele povo sofrido, que por medo e falta absoluta de educação vive a margem da historia oficial.

São 71 anos e a realidade do sertão nordestino Nada mudou. O cangaço se foi e no lugar surgem os jagunços (pistoleiros de aluguel), os coronéis hoje são os “neo coronel” e espalhados estão infiltrados nos três poderes, gozando de todos os privilégios.

A seca? Ainda serve de curral eleitoral para a maioria dos políticos, matando milhares de sertanejos e os colocando numa situação de subserviência perante o poder publico. A corrupção? A mesma. Mudaram partidos que estão no poder, os personagens e a moeda...

O bolsa esmola é o maior projeto de compra de voto legalizado do mundo ( seria então uma forma de coronelismo, talvez uma mutação?). Eu? Estou do lado da história, não da história acadêmica que por vezes lega a cultura popular um segundo plano.

Estou do lado dos perdedores, dos excluídos socialmente, da cultura popular e do sofrimento do meu povo.
Ideologias a parte: O cangaço é sim um movimento de cunho social, que antecede mesmo o período republicano, há registros de situações que perdura ai mais ou menos 200 anos de recorte temporal.

Hasta siempre !
Carla Alberto.

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