quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Jesuino

O CANGACEIRO ROMÂNTICO 
por Ângelo Osmiro Barreto.

Jesuíno Alves de Melo Calado ou simplesmente Jesuíno Brilhante, o cangaceiro romântico. Nasceu no sítio Tuiuiú nas proximidades de Patu no Estado do Rio Grande do Norte. Agricultor e criador até os vinte e cinco anos, era um homem pacato. Segundo o grande folclorista potiguar Câmara Cascudo que por sua vez ouvira do padre Antônio Brilhante, Jesuíno era de estatura baixa, robusto, pele clara, arruivado e de olhos azuis, falava manso e tato; exímio atirador tinha grande pontaria sendo ainda ambidestro. Casou-se com uma prima, chamada Maria Carolina C. de Mello com quem teve cinco filhos.

Coroné Ângelo
Um verdadeiro “Robin Hood” do Sertão, roubava dos ricos para distribuir aos pobres, tendo como fato que durante a grande seca que assolou o sertão nordestino em 1877, uma das mais catastróficas da história, ele e seu bando saqueavam os comboios enviados pelo governo transportando alimentos. Distribuía aos flagelados a seu critério; era aquele que protegia as donzelas ultrajadas, fazendo casamentos, principalmente de filhos de poderosos que abusavam das filhas dos sertanejos humildes, achando que não seriam punidos ou obrigados a casar.

A entrada de Jesuíno Brilhante no cangaço deu-se em razão de uma desavença com uns vizinhos da família Limão, esses ligados ao partido Conservador, então dominante da política local, em contra partida a família de Jesuíno estava ligada ao partido Liberal, “em baixa” como se dizia na época. Este fato em especial viria causar a perseguição de Jesuíno por parte de um governo tendencioso.

Após um roubo de cabras na fazenda dos Calados, praticados por membros da família Limão, a briga esquentou, tendo um irmão de Jesuíno de nome Lucas Alves, levado uma surra de Honorato Limão na “rua” de Patu. O fato revoltou Jesuíno Brilhante que se dirigiu à localidade em busca de vingança, tendo encontrado o agressor em um bar, zombando e mandando abrir uma garrafa de cachaça em “honra do morto”. Jesuíno invadiu o estabelecimento comercial e matou Honorato Limão a golpes de faca, fato ocorrido precisamente no dia 25 de dezembro de 1871, noite de natal.

Outra versão é que um menino da família Limão teria desrespeitado o patriarca da família, o major João Alves de Mello Calado. Zé Limão cumprindo ordens de seu patrão José Lobo, fora à fazenda Tuiuiú devolver uma junta de bois que João Alves havia emprestado a seu patrão. Desgostoso com a ordem, o moleque foi a contragosto e chegando a propriedade dos Calados, não tratara com o devido respeito ao velho fazendeiro. Naquele mesmo instante chegava à fazenda Jesuíno, filho de João Alves que presenciou toda a cena e pediu respeito para com seu pai, o menino atrevidamente respondeu ao filho de João Alves e puxou uma faca para agredi-lo, sendo desarmado e dominado por Jesuíno, acabou levando uma surra. A família Limão passou a jurar vingança pela sova levada pelo caçula.

A partir do assassinato de Honorato Limão, Jesuíno Alves de Melo Calado passaria a ser Jesuíno Brilhante, o nome era uma homenagem a um tio, que havia abraçado a vida bandoleira anteriormente.

Sua vida foi repleta de histórias extraordinárias, como a que uma vez, chegando à fazenda de um conhecido seu, pediu ao fazendeiro cavalos, viveres e dinheiro, tendo este negado, dizendo que dar não daria se quisesse que levasse, Jesuíno respondeu-lhe que era cangaceiro sim, ladrão não, montou em seu cavalo e saiu sem mais nada dizer ou fazer. Outro fato famoso de sua vida bandoleira deu-se no assalto a cadeia de Pombal na Paraíba, com o intuito de soltar seu irmão que estava preso naquela cidade. Assim como também o ataque à cadeia de Martins no Rio Grande do Norte, quando, enquanto tiroteava com seus inimigos ia furando buracos nas paredes das casas conjugadas, indo sair na última casa da rua, deixando seus adversários atônitos com sua astúcia. Nesta ocasião deu fuga a 43 presos conforme consta no processo aberto para apurar o caso.

Jesuíno entrou na vida bandoleira aos vinte e cinco anos, passando cerca de dez anos vivendo em baixo do cangaço, porém jamais foi assalariado para cometer qualquer tipo de crime, tinha orgulho de dizer que nunca havia matado para roubar.

Dentre as histórias heróicas da tradição oral atribuída a Jesuíno Brilhante, conta-se que certa vez pedindo pouso em uma fazenda, foi atendido pela mulher do fazendeiro, pois este estava viajando. Aflita, a mulher pede socorro, um valentão do lugar havia mandado avisar que ela se preparasse àquela noite, pois ele viria dormir com ela. Jesuíno orientou a mulher a sair de casa e tomou seu lugar no quarto. Brilhante esperou o valentão, que apareceu à noite e adentrou no quarto pensando encontrar a pobre mulher indefesa. Pouco tempo depois o homem saiu gravemente ferido e veio a falecer. Ao amanhecer a mulher voltou para casa, encontrou Jesuíno que a tranquilizou, dizendo ter resolvido o problema, o valentão não voltaria mais, pois havia viajado.

Também no Ceará, o cangaceiro romântico fez das suas. Após sua esposa e seu pai sofrerem severas humilhações praticadas pelo Alferes Sá Leitão no Rio Grande do Norte, o militar agressor tentou refugiar-se nas redondezas da cidade de Russas, onde para seu azar, moravam vários familiares do cangaceiro. Não demorou muito para que Jesuíno Brilhante fosse avisado pelos parentes do paradeiro de seu inimigo.

Deslocou-se para as terras jaguaribanas acompanhado somente do cabra conhecido por Pajeú. Sabendo de todos os passos do militar, Jesuíno preparou uma emboscada e feriu mortalmente seu opositor, após o ocorrido voltou oculto para o território potiguar.

Sua saga foi romantizada pelo grande escritor cearense Rodolfo Teófilo, através do livro “Os Brilhantes”. Escritor nascido na Bahia, entretanto dizia ser cearense por opção.
Algumas histórias de gentil homem são atribuídas hoje em dia ao cangaceiro Lampião, o que cria de certa forma uma áurea de herói para o cangaceiro do Pajeú, o que na realidade Lampião não foi, algumas dessas atitudes foram mesmo protagonizadas pelo cangaceiro herói potiguar, esse sim um cangaceiro romântico. Outras histórias sequer existiram, sendo pura criação do imaginário popular.

A vida de Jesuíno Brilhante foi heróica, e sua morte não poderia ser diferente. Sendo atacado pela polícia comandada por um seu inimigo da família Limão, vendo-se acuado montou em seu cavalo e partiu célere em direção dos seus perseguidores disparando seu bacamarte, mas foi ferido mortalmente pelo inimigo. Jesuíno foi ainda carregado pelos companheiros, vindo a falecer no lugar Palha, no meio do mato, onde foi enterrado. Anos depois seu amigo o médico Francisco Pinheiro de Almeida Castro exumou o esqueleto, levando a caveira para Mossoró, daí para a cidade do Rio de Janeiro de onde não se sabe hoje seu paradeiro. Jesuíno Brilhante o verdadeiro Cangaceiro Romântico.

Este texto foi publicado na Revista da ALMECE (Academia de Letras dos Municípios do Estado do Ceará) . 
Um grande abraço, Um feliz natal e um ano novo repleto de paz e saúde para os leitores do Lampião Aceso , e para os sócios e amigos da SBEC .
Att Ângelo Osmiro 

*Ângelo Osmiro Barreto é Historiador e Pesquisador do Cangaço, atual presidente da SBEC - Sociedade brasileira de estudos do cangaço.

3 comentários:

Sérgio Dantas.'. disse...

Parabéns ao amigo Ângelo por trazer a lume notícia sobre o conterrâneo Jesuíno Brilhante, o 'CANGACEIRO', na real acepção da palavra.
É curioso - e digno de análise - porque figuras de cangaceiros chamados 'românticos' ou 'justiceiros', como é o caso de Brilhante, Antônio Silvino e Adolfo Meia-Noite são relegados a planos exageradamente inferiores. Os estudos sobre estes personagens são quase inexistentes.
Lampião, possivelmente o mais sanguinário de todos, é o mais estudado, o mais mitificado, o mais vendido, o mais cultuado e até mesmo 'o mais idolatrado' dentre tantos outros que o precederam.
Será que é o 'prazer de sangue' que reside no inconsciente de cada um de nós?
Acho que é uma questão que desafia o tirocínio não só de estudiosos do cangaço, mas também de antropólogos, sociológicos, psicólogos, etc.
Há um prazer mórbido aí dentro de cada um de nós, que precisa ser analisado à luz destas Ciências.
Os reais cangaceiros que aplicaram Justiça (a seu modo, bem entendido), estão a cada dia mais esquecidos. Qual a razão?
Parabéns, amigo Ângelo pelo artigo e por nos lembrar de tão importante figura.
Sérgio.'.
NATAL

IVANILDO SILVEIRA disse...

PARABÉNS AO AMIGO ÂNGELO OSMIRO PELA PUBLICAÇÃO E PELA MAESTRIA COM QUE ESCREVEU O EXCELENTE TEXTO SOBRE O FAMOSO CANGACEIRO " JESUINO BRILHANTE".

Um abraço
IVANILDO SILVEIRA
Colecionador
Natal/RN

Wellington Holanda disse...

MEU TIO TATARAVO