segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Artesão cearense leva couro do cangaço à passarela da SPFW

Em 1938, Lampião pediu uma sandália ao pai de Espedito Seleiro.  

Muitos anos depois, ele transformou o molde em tendência fashion.

Por: Daniel ADERALDO, iG Ceará

Quando Virgulino Ferreira, de alcunha Lampião – o mais famoso e temido cangaceiro do sertão nordestino –, desenhou o molde de uma sandália com sola retangular, para confundir os rastros deixados pelo caminho, ele não sabia, mas estava criando um estilo. Hoje, “a sandália do Lampião” é a marca do artesão cearense Espedito Veloso de Carvalho, de 72 anos, conhecido apenas como Espedito Seleiro. Ele parou de vestir vaqueiros e agora se dedica à arte de trabalhar em couro, fazendo calçados e acessórios.


 Espedito Veloso de Carvalho, de 72 anos. 
Foto: Divulgalção/Secretaria de Cultura

Molde direto de Lampião

Os “croquis” de Lampião, guardados pelo pai de Espedito Seleiro, ainda hoje são inspiração para o trabalho do artesão cearense. O rei do cangaço gostava de ornamentar as vestimentas usadas por ele e por seu bando. Um dia, teve a ideia de fazer um calçado com um solado com as partes da frente e de trás idênticas. Servia para confundir e despistar a polícia que sempre estava no seu encalço. Em 1938, quando o grupo de cangaceiros liderado por Lampião esteve, como tantas vezes, na região do Cariri, pediu para um de seus "cabras" encomendar a um conhecido artesão local novas peças. Mandou o desenho de como deveriam ser os calçados.

“Meu pai, o Raimundo Seleiro, estava fazendo uma sela no alpendre de casa, aí chegou um homem e perguntou se ele poderia fazer umas alpargatas de couro com o mesmo material da sela para cavalo. Ele explicou que não era bom nisso, que trabalhava fazendo gibão, chicote, chapéu e sela para vaqueiro, mas aceitou. Depois, quando descobriu que era para o coronel Virgulino, ficou todo se tremendo e nem quis cobrar”, conta, rindo, o mestre no ofício.

Reinvenção


As sandálias Maria Bonita Foto: Divulgalção/Secretaria de Cultura
 Mais tarde, Espedito Seleiro, o quarto da geração de mestres em couro, ainda aos oito anos aprendeu com o pai o ofício. “Cada lapada era uma lição. Foi a melhor coisa do mundo pra mim, porque eu aprendi ligeiro”, relembra. A quarta geração de seleiros vive na pequena Nova Olinda, no Cariri cearense, a 552 quilômetros de Fortaleza, mas seu trabalho já compôs coleção de grife internacional, foi apresentado em desfile na São Paulo Fashion Week e exportado para vários países ao redor do mundo.

A sandália do Lampião foi só o começo na guinada que Espedito deu na carreira, forçado pela necessidade. “Meu pai falava que a dor ensina o cabra a gemer. Quando estava acabando, diminuindo o trabalho para os vaqueiros, eu fui pensando 'puxa vida, a família grande, crescendo, pai faleceu...' Eu tinha que arrumar o feijão para dar a esse povo todo. Perdi muita noite de sono desenhando peça. Deus me deu uma estrela e comecei a fazer bolsa e sandália”, conta ele. “Quando o dia amanhecia eu ia fazer. No comércio ia vendo o que o povo gostava mais, o que se admirava mais. Ia prestando atenção. Quando fiz a sandália do Lampião e ela ficou famosa, imediatamente fiz a da Maria Bonita”.

As cores

O colorido das peças de Espedito passou a ser uma de suas principais marcas. É difícil ir ao ateliê e loja do artista no centro de Nova Olinda e não se encantar com a riqueza de tonalidades. O processo de criação desse colorido tem um bastidor curioso. “Perdi tempo com isso aprendendo a tingir. Tinha tinta que ficava feia feito urubu. Mas a cor tão feia era a primeira que vendia. Nem é marrom nem é preta. É cor de burro quando foge”, brinca.

A fama que Espedito ganhou no mundo da moda com seus cintos, calçados, bolsas e carteiras multicoloridos acabou se espalhando e ele recebeu uma encomenda como há tempos não havia. Era para fazer gibão, sela, chicote e bota. A indumentária de um legitimo vaqueiro do sertão foi usada pelo ator Marcos Palmeiras no filme “O Homem que desafiou o Diabo”.

Hoje o cabra passa por mim e nem fala. Pensa que eu trabalho só pro povo de fora, e que não sou mais o mesmo. Mas o que eu faço é por prazer, e ainda faça melhor e mais caprichoso se for para um vaqueiro

As origens 

Com a profissão do vaqueiro em extinção, os gibões e chapéus do ateliê se tornaram mais uma atração para turista ver, compondo junto com o próprio Espedito e seu local de trabalho uma espécie de cartão-postal. Algo que causa certa melancolia nesse mestre do couro. “Hoje o cabra passa por mim e nem fala. Pensa que eu trabalho só pro povo de fora, e que não sou mais o mesmo. Mas o que eu faço é por prazer, e ainda faça melhor e mais caprichoso se for para um vaqueiro”, conclui.

Depois da dica do coroné Ângelo Osmiro pesquei no: IGUltimo segundo

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Adendo Lampião Aceso
Na primeira edição do Cariri cangaço em 2009 os participantes - entre eles este blogueiro - tiveram a oportunidade de conhecer Nova Olinda e visitar o atelié desta celebridade sertaneja chamado Espedito Seleiro.

Obrigado Coronéeeeee Severo

Contato com Seu Espedito:
(88) 3546 - 1432 / 9927 - 0402

 

3 comentários:

Sergio disse...

Amigo, carece informar o contato do cabra, para os interessados adquirirem um par de alpercatas, uma carteira de couro ou outro acessório.
Trabalho de primeiríssima.
Abs

Kiko Monteiro disse...

Como se diz no Ceará Lá está. A matéria original não apontava os contatos. Eu também não os tinha, pesquisei inda agora pra atender o amigo.

Abraçando!

Sergio Dantas disse...

Obrigado assim mesmo, compadre. Abs