Por João de Sousa Lima*
Jeremoabo é uma cidade histórica e muito antiga, durante a Guerra de Canudos a cidade serviu de base para uma das companhias do Exército que atacaram o Conselheiro e os Conselheiristas. Em 1739 o Garcia D´Ávila doou uma grande extensão de terras para a construção da Matriz. A povoação tem em suas origens as tribos de Índios Massacará, Cahimbés e Cariris. Abastecida pela cristalina água que jorra da fonte da Pedra Furada e banhada pelo Vaza Barris.
Jeremoabo também foi palco da repressão ao cangaço, formando em suas comunidades volantes policiais que perseguiam sem tréguas os cangaceiros, sendo uma das mais famosas a volante comandada por Zé Rufino, um dos maiores matadores de cangaceiros. A cidade serviu de repressão ao mesmo tempo em que foi uma base de proteção através de um dos grandes coronéis daquela época, o famoso coronel e político João Sá.
Jeremoabo foi uma das cidades onde mais se entregaram cangaceiros depois da morte de Lampião, várias fotografias mostram esses cangaceiros na companhia de padres e policiais. Um dos grupos que se entregou em Jeremoabo foi o grupo do cangaceiro Criança. Criança aparece em fotografia ao lado de sua companheira Dulce (ainda viva e residindo em Campinas, São Paulo), Balão e Zé Sereno.
Criança está sentado a esquerda de Dulce
a única cabrocha na imagem.
Criança depois que foi liberado seguiu para o estado mineiro e posteriormente até o estado de São Paulo. Pouca coisa ficou gravada sobre esse cangaceiro e seguindo seu rastro fui encontrar em Jeremoabo, justamente na cidade de repressão ao cangaceirismo, residindo uma Irmã sua.
João de Sousa Lima e Joana Matilde da Conceição.
Com 89 anos de vida, encontra-se lúcida e relembra emotiva dos tempos árduos quando com apenas 10 anos de idade viu o irmão João entrar para o cangaço.
Manuel Lourenço Xavier e Maria Matilde da Conceição, pais de dona Joana, residiam no sítio Poço Grande, em Macururé, no alto Sertão baiano. Com as perseguições policiais e os maltrato sofridos, a família teve que fugir e atravessaram o Rio São Francisco, saindo da Barra próxima a Curral dos Bois chegando a Belém do São Francisco, Pernambuco, indo por fim se arrancharem em Santa Maria, povoação entre Belém e Floresta.
Na fuga para o estado pernambucano a família deixou as criações e em um dia de sábado João* e os primos Pedro e Feliciano retornaram para tentar reunir e alimentar os animais. Os três jovens não retornaram no prazo determinado. Maria Matilde ficou apreensiva com a falta de noticias dos rapazes.
Em um dia de feira na cidade de Belém, Maria e a família se encontrou com Vicente Baldo da Silva, que era irmão da matriarca e tio de João. Vicente deu a péssima notícia: João e os primos haviam entrado para o cangaço. Maria chorou copiosamente, a família se abraçou e a pequenininha Joana, com seus dez anos de idade não compreendia a situação. Vicente só não contou que foi ele quem ajeitou a entrada dos jovens para o cangaço.
João ganhou no cangaço o apelido de Criança por ser o mais jovem dos três rapazes, o primo Pedro ficou sendo conhecido como "Canjica" e Feliciano foi apelidado de "Zabelê".
Dona Maria estava com os filhos Joana, Luiz Lourenço Xavier, Januário e Rosendo estavam na Fazenda Pinhão, próximo a Cabrobró e ficaram sabendo das mortes dos primos Canjica e Zabelê e atravessaram o Rio para Macururé para confirmarem a notícia. Em Macururé as cabeças dos dois cangaceiros foram expostas e a pequena Joana foi proibida de olhar os Troféus Macabros . Confirmado a morte dos dois familiares só restou a Maria rezar para a proteção do filho João que ainda estava na vida cangaceira.
Com a morte de Lampião Criança se entregou em Jeremoabo junto com mais alguns companheiros. Na cadeia o padre Magalhães aproveitou para realizar o casamento de Criança e Dulce, o matrimônio sagrada unia sob as grades da prisão dois bandoleiros das caatingas nordestinas.
"Criança" em fotolito do documentário "O ultimo dia de Lampião"
Em 1968 Joana seguiu com o filho Dudu até São Paulo para visitarem João, o ex-cangaceiro Criança.
No reencontro João se emocionou ao avistar a irmã que havia deixado ainda criança. O momento serviu para aliviar a saudade que por tanto tempo afligiu aquela menina-mulher, que em um dia de feira viu sua querida mãe verter lágrimas pela ausência de um filho amado que seguiu para as hostes do cangaço e na imensidão das caatingas viu a morte passar próximo e o sangue manchar a terra seca.
"Dona Joana, mulher forte, baraúna sertaneja, flor de cacto que aflora mesmo diante das intempéries, anjo-mulher, que tuas dores sejam aliviadas pelo simples dom de ser uma mulher que aprendeu a amar a vida sem temer as adversidades. Tenho muito orgulho de tê-la conhecido, de ter rastreado suas histórias de vida, de ter conhecido teus segredos tão bem guardados no cofre da memória".
Jeremoabo/ Paulo Afonso, dias 23, 24 e 25 de abril de 2012.
*Historiador/Pesquisador e Escritor. Membro da SBEC- Sociedade Brasileira de estudos do Cangaço.
Membro da ALPA- Academia de Letras de Paulo Afonso, cadeira nº 06.
**Assim como outros companheiros de cangaço João mudou seu primeiro nome passou a se Chamar "Vitor Rodrigues"
4 comentários:
História viva
Amigo João de Sousa Lima: "O faro que caça a caça, fareja o caçador". Esse trocadilho é para te dizer o quanto é importante a tua procura exitosa, rastreando pedaços importantes da História do cangaço. O caminho é esse. Nós pesquisadores de Lampião e seus cabras te agradecemos. O bom caçador encontra sempre e acerta o alvo. Um abraço!!! VIVA O ESTUDO DO CANGAÇO!
JOBENO
João Pessoa-PB, 30 Abril 2012
Minha vó linda cheia de vida, em Setembro completará 90 anos e com uma memória de dar inveja.
Liliane Sá/São Paulo.
Existiu algum cicero ferreira costa e alice flor no cangaço
Há duas ocorrências para Cicero Costa
Cícero Costa, ou Ciço Costa (um Paraibano) foi um cangaceiro que agia na região de Conceição de Piancó PB e chegou a participar do bando de Sinhô Pereira e posteriormente o de Lampião em várias ocasiões.Uma delas foi o ataque a casa do Cel Luiz Gonzaga Ferraz em Belmonte,PE em 20 de outubro de 1922, saindo inclusive ferido.
E teve outro Cícero Ferreira, um civil que foi um dos responsáveis pela morte do cangaceiro Arvoredo em maio de 1934.
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