Coronel "Zé" Lucena
Por: Luiz Nogueira Barros
( * )
José Lucena de Albuquerque Maranhão
De grande perseguidor de cangaceiros à político.
Vou ao cemitério visitar o túmulo de minha mãe. Estou em
Maceió e sou adulto. Na saída pergunto para um funcionário:
– Aquele é o túmulo do coronel Lucena?
Ele me diz que não sabe, que trabalha ali faz pouco tempo.
Fico a me lembrar de que o coronel foi prefeito de Maceió *(1953-1955). E de que o seu
túmulo foi uma homenagem da Prefeitura, ao tempo do prefeito Sandoval Caju.
E mais: que morrera humilde e sem riquezas. E logo um frio
percorre o meu corpo. E os ventos - tais os da infância - me transportam aos
anos quarenta. Estou em Santana do Ipanema.
A cidade se confunde com as minhas
lembranças. O velho Quartel da Polícia Militar enche o meu olhar. Nele
funcionava o "Comando de Caça a Lampião", que tinha como comandante o
coronel Lucena. Tipo forte, cabelos ondulados, boca pequena, nariz fino, corado
e sempre alegre, ele encarnava o mito da coragem. Fora disso, era o homem venerado
e de quem jamais se colocou em dúvida a honestidade de princípios.
E de súbito, vejo-me na formatura do curso primário tendo o
coronel como nosso padrinho, fato sobre o qual até bem pouco eu ainda tinha uma
fotografia. Depois o coronel está abraçado com "Seu" Carola, dono da
maior farmácia da cidade, brincando o carnaval acompanhado por uma multidão de
foliões, entrando em todas as casas da cidade e recebido como um rei.
Um rei
para o qual as famílias preparavam comidas e bebidas. Mas os dois foliões não
bebiam. Os seus acompanhantes, pessoas simples do povo, é que se fartavam. O
que valia era a alegria de receber o coronel e o seu inseparável amigo de
carnaval. Percorrendo ruas e ruas o coronel a todos prestigiava tornando os
carnavais tranquilos.
Mas o coronel Lucena não era o único mito da cidade. Ele
dividia o privilégio com o padre Bulhões. Um era o poder material e outro o
poder espiritual. Coronel Lucena, no Monumento – parte alta da cidade. E padre
Bulhões, no Camoxinga – parte baixa da cidade.
Assim, eles estendiam um arco de proteção sobre toda cidade.
Um dia o tenente Porfírio, homem valente, tornara-se suspeito de que se preparava
para formar um bando de cangaceiros. Já houvera morto uma esposa, segundo
suspeitas. A desculpa fora simples: encontro casual com grupos de cangaceiros,
tiroteio e etc. Saíra-se bem com a justiça. Mas haveria de matar outra esposa
de nome Durvalina, refugiando-se no Camoxinga. Todos sabiam que cangaceiros não
agiam nas terras de Senhora Santana. E o coronel Lucena mandou-lhe ordem para
comparecer ao quartel, através de seus dois soldados de confiança, Artur e Zé
Pereira. Mas tenente Porfírio debochou:
– Digam ao coronel que a distância é a mesma. Ele que venha
aqui.
Acabrunhados, os soldados comunicaram o fato ao coronel. E
ouviram:
– Muito bem: voltem e tragam Porfírio de qualquer jeito!
Quando os dois se aproximaram da casa de Porfírio ele já
saltou de revólver em punho, na varanda. Mas tombou (numa fração de segundos)
mortalmente ferido, sem ter tido tempo para algum tiro certeiro. Colocado numa
rede foi levado para o quartel e depois sepultado com uma sava de tiros a que
tinha direito. Abriu-se inquérito policial para apuração da ocorrência. Motivo:
desacato a autoridade.
Desperto-me. Estou outra vez em Maceió. Olho para a presumível sepultura. Não consigo ir vê-la de perto. E deixo o cemitério remoendo lembranças e ainda sentindo os ventos da infância.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
( * ) Luiz Nogueira
Barros
Nascido em Pão de Açúcar a 02 de novembro de 1935. Em 1941 sua família
mudou-se para Santana do Ipanema, onde permaneceu até 1950. Daí que entre próximo
que será publicado, com ensaios, e contos, 30 contos retratam histórias de
Santana do Ipanema. Médico, formado pela Faculdade de Medicina da UFAL, em 1963.
Atualmente aposentado pelo Ministério da Saúde. Sócio efetivo do Instituto Histórico
e Geográfico de Alagoas, função de Segundo Secretário, em seguida Secretário
Perpétuo em 2001. Segundo vice-presidente, diretoria de transição, após a morte
do presidente, prof. Ib Gatto Falcão, da Academia Alagoas de Letras. nogueirabarros@uol.com.br
Publicado originalmente no Jornal Gazeta de Alagoas, em 18/4/1993
Disponível online em sistema3001.com.br/?p=353
------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As " fotos e informação complementar" foram inseridas a matéria, no sentido de enriquecê-la..
Créditos do achado e inserção das fotos para:
Ivanildo Alves da Silveira
Ivanildo Alves da Silveira
Colecionador do cangaço
Membro da SBEC e do Cariri-Cangaço
Natal/RN
2 comentários:
Kiko, seu blog é muito organizado e rico. Parabéns.
Caríssimo Daniel, muito obrigado pela deferência e incentivo pra seguir! Estamos trabalhando duro na recuperação de centenas de matérias cujas imagens expiraram prejudicando a pesquisa.
Atenciosamente Kiko Monteiro!
Postar um comentário