segunda-feira, 31 de maio de 2010

Jornal Tribuna do Norte, Natal-RN - Edição de ontem, 30/05

Nas pegadas de Lampião no ‘lombo’ de uma moto


Por Valdir Julião repórter 

Em lombo de cavalo, de jumento ou a pé, a incursão do bando do capitão Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, pelo Rio Grande do Norte, na segunda década do século XX, durou apenas três dias: tempo suficiente para virar lenda e se perpetuar no imaginário popular dos potiguares, além de se converter no anti-herói de Mossoró, que era o principal alvo da cobiça dos cangaceiros por ser, como é ainda hoje, o município polo e mais rico da região Oeste.


A Gruta da Carrapateira, em Felipe Guerra, foi uma das três grutas que abrigaram os fugitivos do bando de Lampião, expulsos de Mossoró.
 
Oito décadas depois e por conta da argúcia e curiosidade de dois espeleólogos (estudiosos das cavernas) esse percurso de Lampião foi refeito ao longo de 90 dias. Entre idas e vindas, o técnico em turismo Rostand Medeiros e o advogado Sólon Almeida Netto revezaram-se em seguir uma trilha de 500 quilômetros entre o município de Luís Gomes, por onde o bando de cangaceiros entrou no Estado, e Mossoró, última cidade escolhida para encerrar a onda de saques em território potiguar.

“Nessa época, em junho de 1927, só existiam sete municípios na região”, diz o pesquisador Rostand Medeiros, que ao invés de cavalos, usou o “lombo” de motos para refazer a cavalgada de Lampião pelo sertão do Rio Grande do Norte.

Rostand Medeiros explicou que a ideia de se percorrer os rastros de Lampião e seu bando, surgiu depois de descobrir e ouvir de algumas pessoas - “filhos e netos de moradores da região que viveram naquela época” -, relatos sobres as escaramuças dos cangaceiros, como roubos, saques, pilhagem, raptos, seqüestros e violência cometida contra as pessoas e fazendas que vinham encontrado pela frente.

Medeiros diz que, com seu companheiro Sólon Almeida Netto fizeram dois trabalhos, um que resultou numa pesquisa sobre 83 cavernas da região Oeste e o segundo, um relatório de 300 páginas, que chamou de “Nas pegadas de Lampião”.

Nesse segundo trabalho, segundo Medeiros, existem relatos de pessoas, cujos ascendentes fugiram de suas casas e se esconderam em cavernas para escapar dos cangaceiros: “Nós percorremos quinze cavernas, mas descobrimos que só três cavernas serviram de esconderijo, duas em Felipe Guerra e uma em Baraúna, que na época pertencia a Mossoró”.

 O espeleologista Rostand Medeiros disse que, ele e seu amigo, tentaram percorrer, ao máximo, os mesmos trechos onde passaram Lampião e seu bando, contando com informações orais, principalmente, das pessoas mais velhas dos municípios originalmente percorridos pelos cangaceiros: Luís Gomes, Martins, Pau dos Ferros, Apodi, Caraúbas e Pau dos Ferros.

Com o tempo, explicou ele, houve desmembramento territorial e criação de outros municípios, por isso, a trilha de Lampião foi percorrida em 18 municípios.

Por onde Rostand e Almeida Netto andavam, iam descobrindo coisas e vestígios sobre o período e a passagem de Lampião pela região Oeste. “Nossa proposta foi conhecer e percorrer o caminho o mais próximo da realidade dos fatos que ocorreram”, sintetizou o pesquisador, cujo trabalho e de seu companheiro, despertou o interesse em transformar o episódio numa forma de induzir e desenvolver negócios na área de turismo na região. “É o que estão chamando de culturalização da economia”, completou.
 
Missa do Soldado é um dos marcos da passagem de Lampião pelo RN

Para refazer o mesmo roteiro da passagem de Lampião no Rio Grande do Norte, entre os dias 10 e 13 de junho de 1927, o pesquisador Rostand Medeiros se baseou em pelo menos três livros publicados sobre o cangaço, de autoria dos escritores Raul Fernandes, Raimundo Nonato e Sérgio Dantas. “Cada um tem o seu foco, a sua importância”, afirmou ele.

Mas Rostand Medeiros não dispensou “a oralidade” das pessoas que foi encontrando, nem os “casos e causos” que lhe foram contando. Ele disse que descobriu algumas coisas inéditas, como a realização da chamada “Missa do Soldado”, que é celebrada em homenagem ao policial José Monteiro de Matos, morto em combate contra os cangaceiros de Lampião, no confronto que foi chamado pela população de “Fogo da Caiçara”.

Segundo Rostand, as tropas da Polícia do Rio Grande do Norte enfrentaram os cangaceiros na localidade denominada Junco, hoje situada a cinco quilômetros do município de Marcelino Vieira, no Alto Oeste. No decorrer do combate, às vésperas da invasão a Mossoró, segundo relatos, os soldados foram recuando, enquanto o soldado Monteiro ficou no local e teria dito o seguinte: “Morro, mas não corro”.

Por conta disso, a “Missa do Soldado” é realizada, anualmente, a cada 13 de junho, na Dia de Santo Antonio, na capela homônima. “O povo mantém a tradição”, disse Rostand. Próximo ao açude da Caiçara também foi construído um monumento em homenagem ao soldado morto em combate com os cangaceiros.

O pesquisador conta que descobriu, no município de Luís Gomes (Alto Oeste), a casa que pertenceu ao pai do cangaceiro Massilon Leite, que foi o guia de Lampião para adentrar no RN, inclusive prestando informações sobre Mossoró, a qual Lampião decidiu atacar.

Deste município potiguar, que faz divisa com a Paraíba, o capitão Virgulino iniciou suas escaramuças pelo RN, que terminou com o ataque e sua retirada em Mossoró, em virtude da resistência comandada pelo então prefeito Rodolfo Fernandes.

Aos 92 anos, dona Leonila fala de Lampião

Entre os municípios de Felipe Guerra e Caraúbas está situada, na fazenda Santana, uma das duas grutas das redondezas que serviram de esconderijo para os fugitivos do bando do capitão Virgulino Ferreira da Silva.

Nessa gruta, denominada “Tapia de Zé Félix”, escondeu-se em 12 de junho de 1927, dona Leonila Tomé de Souza Barra. Hoje, aos 92 anos, falou de suas lembranças aos pesquisadores Rostand Medeiros e Solón Almeida Netto.

Os pesquisadores localizaram dona Leonila Barra em 12 de setembro de 2009. Através de suas lembranças, pois ela tinha dez anos quando ocorreu a fuga da família comandada por sua mãe, souberam que a matriarca Tionila Nogueira Barra e os moradores buscaram refúgio na fazenda Passagem Funda, a cerca de três quilômetros de sua propriedade, onde se abrigaram por quase 30 dias nessa gruta.

Segundo os pesquisadores, Leonila Barra recordou que em meio à notícia da aproximação do bando de Lampião e a todo o tumulto que tomou conta da região, estava com algumas de suas nove irmãs no casarão do Mato Verde debulhando vargens de feijão, quando um portador trouxe a notícia da aproximação do bando.

“Na sua ingenuidade infantil, ela não acreditou na história do mensageiro. Diante dos fatos, sua mãe parte para juntar tudo que pudessem carregar e se esconderem, mas devido à chegada da noite, decidem dormir na fazenda”, historiou Medeiros.

“Quem atualmente visita o local, o encontra preservado tal como era naqueles estranhos dias de junho de 1927”, diz o relatório dos dois espeleólogos.

 




 *Material gentilmente enviado por Rostand Medeiros

Confira a edição online: TRIBUNA DO NORTE

domingo, 30 de maio de 2010

Para quem perdeu!

Passou na  TV 

No dia 11 de maio, o canal por assinatura History levou ao ar o segundo episódio da série DETETIVES DA HISTÓRIA. Nele, André se encontra com um colecionador pernambucano, que afirma ter um dos óculos de Lampião. Temido e adorado, Lampião ficou conhecido por suas invasões pelo sertão de Pernambuco, que incluíam assaltos, cobranças de tributos de fazendeiros e até mortes.

Após ser atingido no olho direito durante uma invasão, ele passou a usar óculos. No berço do cangaço, o apresentador investiga a veracidade do caso.


Assista ao programa dividido em quatro partes:

 





 


Crédito para o confrade Augusto da comunidade do Orkut Lampião, grande Rei do cangaço.
 

sábado, 29 de maio de 2010

Convite

Lançamento: DVD do Cariri Cançaço 2009

De olho... na literatura

Ricardo Albuquerque corrige informações
 
Após leitura do artigo sobre Benjamim postado há alguns dias: Clique aqui  Ricardo Albuquerque (Foto) presidente do instituto que leva o nome de seu pai Chico Albuquerque e neto do célebre Adhemar Albuquerque fundador da ABA FILM nos envia um comentário que merece destaque pelos esclarecimentos sobre informações contidas em recente publicação da literatura cangaceira. 

Lembro aos leitores que o artigo em questão foi encontrado em outro site nós apenas copiamos e publicamos, mas o Blog também está à disposição para réplicas do autor, Sr. Artur Aymoré, se este achar necessário.


Att Adm. Lampião Aceso.


Prezado Artur Aymoré

Com todo o respeito, sinto-me obrigado a fazer as seguintes correções em seu texto a respeito de Benjamin Abrahão:
 

1) Benjamin até a data de 1936 nunca havia sido fotografo e/ou cinegrafista. Alem de ceder todo o material para a empreitada, meu avô Adhemar Bezerra de Albuquerque (ABA Film) deu à Benjamin todas as noções básicas do manuseio do equipamento.
 

2) Apos a primeira visita ao bando em 1936, quando permaneceu por 3 semanas, todo o trabalho apresentado ao meu avô estava velado.
 

3) Em razão da dificuldade de Benjamin com a luminosidade, meu avô soldou a objetiva da maquina e orientou-lhe como se posicionar em relação ao sol para obter resultados satisfatórios.
 

4) Benjamin retornou ao convívio do bando de Lampião, para desenvolver seu trabalho mais 2 vezes em 36 e 37, quando considerou encerrado o trabalho.
 

5) Em seguida, Benjamin veio até Fortaleza, entregando todo o material ao meu avô, para a edição do filme e revelação das fotos, retornando em seguida à Recife onde veio a ser assassinado em 38.
Por esta razão, todo o material ficou em posse da ABA FILM.
 

6) Uma vez editado o filme, o meu avô programou e divulgou a primeira exibição no Cine Moderno em Fortaleza.
 

7) Assim que o DIP tomou conhecimento da exibição programada, solicitou ao meu avô que a sessão fosse fechada, como uma sessão de aprovação da censura.
Disponho de uma foto da platéia, onde pacificamente representantes do DIP e meu avô assistem esta primeira exibição. Ao final da sessão, o DIP não só proibiu futuras apresentações, como apreendeu o filme.
 

8)Em 1955, apos o suicidio de Vargas, meu avô passou à Alexander Wolff, que fazia a distribuição dos filmes produzidos por ele um copião que ele havia escondido por todos estes anos.
 

9) Wolff solicitou ao cineasta Al Ghiu que fizesse uma nova edição do filme, que acabou sendo exibido ao publico pela primeira vez no Rio de Janeiro em 1955.
 

10) Benjamin Abrahão tem um filho vivo, Atahla que vive em Niterói.
 

11) Em 2004, a minha família (Albuquerque), a família de Lampião e Maria Bonita e a família de Benjamin Abrahão formamos uma sociedade com a finalidade de preservar todo este material iconográfico do Cangaço.

Caso tenha interesse em manter um contato, o meu e-mail é: icchicoalbuquerque@uol.com.br


Um pouco sobre o trabalho de Ricardo Albuquerque:

Instituto Chico Albuquerque 
Relíquias iconográficas do cangaço em Fortaleza

Durante 20 anos, Lampião e seu bando percorreram o sertão nordestino a perpetrar feitos que fizeram do capitão Virgulino um mito. Mitificação essa construída a partir do sertão interiorano ao litoral mais desenvolvido, para dele se espraiar a todo o Brasil de ainda precários meios e vias de comunicação. Durante muito tempo, a saga do cangaço foi noticiada através dos cantadores de feira, dos emboladores, dos cegos rabequeiros e da literatura de cordel.
 
Para quem não tinha chegado a ver um cangaceiro de perto, Lampião poderia passar à história como um
fora da lei que talvez nem tivesse existido além da xilogravura ou do desenho. Não fosse a visão de um mascate libanês cuja ousadia foi fundamental para a compreensão atual do fenômeno do cangaço. Benjamim Abrahão foi o responsável pela memória iconográfica do bando de Lampião. Trata-se de uma verdadeira façanha a captura exclusiva de momentos da intimidade cotidiana do cangaceiro e seu grupo, que virou tema do longa-metragem brasileiro “O Baile Perfumado”, de Lírio Ferreira.
 
Todo esse material está disponível hoje em Fortaleza (CE), sob os cuidados do Instituto Cultural Chico Albuquerque – pioneiro da fotografia publicitária no Brasil. A entidade é vinculada à rede de lojas especializada em materiais fotográficos Aba Film, e detém os direitos de uso do trabalho do fotógrafo. O acervo é composto por uma série de 99 fotos e um vídeo de 11 minutos, além de outras 400 fotos coletadas por Ricardo Albuquerque sobre o cangaço, a maioria de fotógrafos amadores. “Essas outras fotos são anteriores às de Benjamim. Existem outras de Lampião com vestimentas diferentes da habitual. Bem pobres em relação às usadas no final do cangaço”, revela Ricardo, presidente do instituto e filho de Chico Albuquerque. Ele diz que foi Dadá, mulher do cangaceiro Corisco, quem motivou os cangaceiros a usarem roupas enfeitadas.
 
A história das fotos e imagens começa com a chegada de Benjamim Abrahão a Juazeiro do Norte. O viajante acabou conquistando a confiança de Padre Cícero e virou seu secretário. Com a morte do padre, decidiu renovar contato que já possuía com Lampião – o cangaceiro era devoto de Padre Cícero – e propôs a Ademar Bezerra Albuquerque, avô de Ricardo Albuquerque e fundador da Aba Film, registrar a rotina do grupo. Proposta aceita, o “mascate-fotógrafo” foi ao sertão, e após um mês de convívio com o bando e todo o equipamento para cobertura, verificou que o filme havia velado. Disposto a cumprir seu intento, Benjamim recebeu dicas de Ademar, voltou outras duas vezes e conseguiu os registros. O ano era 1937. Em 1938, Benjamim foi assassinado em Recife (PE).
 
Segundo Ricardo Albuquerque, depois do episódio, Ademar tentou exibir o filme no Cine Moderno,
em Fortaleza, ainda em 1938. Mas o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) do Governo Getúlio Vargas censurou e confiscou a película ao assistir uma prévia. Sorte que Ademar fizera uma cópia do material. As fotografias foram reproduzidas por diversos veículos como o jornal O Povo, de Fortaleza, e até pelo O Globo. O filme do grupo de Lampião foi exibido pela primeira vez em 1950 e serviu para outra película, “Memória do Cangaço”. Uma sala na sede da Aba Film (Rua Costa Barros, 915, 9º andar, Centro), abriga hoje todo o material em disponibilidade para publicações.
 
As fotos que registram a história de Lampião e seu bando foram restauradas em 2003, quando Ricardo voltou de São Paulo para morar em Fortaleza. O vídeo teve sequências compiladas e foi recuperado graças a projeto bancado pela Petrobras.
 
O direito autoral pertence à família Albuquerque, e o de imagem à família de Lampião. “É uma parceria. Há um contrato entre as partes, inclusive a família do Benjamim. E eu tenho uma procuração para cuidar disso tudo”, informa Ricardo Albuquerque.

Fonte: Revista Nordeste 21, edição nº1, Maio de 2009.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

O cineasta libanês de Lampião



Por Isaura Daniel
da ANBA, Agência de Notícias Brasil-Árabe



As únicas filmagens que existem do cangaceiro Lampião têm como autor um imigrante libanês: Benjamin Abrahão Botto. Ele registrou o cotidiano de Virgulino e seu bando na década de 30 na caatinga.

São Paulo – A imigração árabe está tão presente no cotidiano brasileiro que tem participação até na história de um dos grandes mitos do país, o cangaceiro Lampião. Foram mãos da colônia as responsáveis por fazer as únicas imagens de Virgulino Ferreira da Silva, quando lutou contra o coronelismo no Brasil, na primeira década do século passado. O cineasta se chamava Benjamin Abrahão Botto, e, mesmo sem ser profissional, fez, entre os anos de 1935 e 1937, filmagens do cangaceiro e seu bando, no interior do Nordeste.

O que um libanês foi fazer na caatinga nordestina atrás do temido Lampião? A resposta nem os pesquisadores sabem ao certo. Segundo o escritor Antonio Amaury Corrêa de Araujo, que tem onze livros publicados sobre Lampião, é possível deduzir que a motivação foi econômica. “Acredita-se em dois fatores importantes. Primeiro, o Lampião já era uma lenda e Benjamin queria o desafio de entrevistar, fotografar uma lenda. Segundo, ele estava sendo remunerado e bem remunerado”, diz o jornalista Artur Aymoré, autor do livro “O Outro Olho de Lampião – A imprensa e o cangaceiro”, publicado neste ano.

É preciso dizer que Benjamin chegou do Líbano, na época em que seu país pertencia ao Império Turco Otomano, ainda jovem. Assim como muitos árabes, Benjamin chegou com um nome, Jamil Ibrahim, e adotou um outro, Benjamin Abrahão Botto, quando desembarcou, conta Araujo. Os registros históricos indicam que ele chegou a ser mascate e depois a ter uma loja de armarinhos. Seu destino, porém começou a se desenhar para os lados de Lampião quando foi ser secretário de Padre Cícero. Relata Araujo que Benjamin conheceu o cangaceiro por meio do Padre Cícero, em 1926, em Juazeiro, no Ceará.

O trabalho de registro do bando apareceu depois da morte do sacerdote. “Uma empresa alemã contatou uma pequena agência cinematográfica que havia em Fortaleza (Ceará) chamada AbbaFilmes. A AbbaFilmes contatou o Benjamin e perguntou se ele gostaria de encarar esse desafio. Era um desafio porque ele era procurado pela polícia em sete estados”, diz o jornalista Aymoré. Benjamin conseguiu chegar até o bando e teve acesso, então, até a simulações de ataques por parte dos cangaceiros. “O Benjamin era um homem extremamente sociável, acolhedor e conseguiu convencer Lampião de que o documentário reforçaria a sua imagem como destemido, lutador pela justiça social”, diz Aymoré.

A filmagem, porém, não deu seus frutos de imediato. “O filme chegou a ser exibido uma única vez em Fortaleza, mas durante a sessão de cinema a polícia invadiu o local e as pessoas que estavam ali acabaram não assistindo o filme por inteiro. A polícia apreendeu o filme e ele ficou encostado lá, jogado num depósito da Polícia Federal durante mais de 25 anos”, relata Aymoré. Anos depois, cineastas conseguiram resgatar o material e extrair dele nada mais do que 15 minutos. As cenas, aliás, estão no filme “Baile Perfumado”, feito pelos diretores Lírio Ferreira e Paulo Caldas sobre Benjamin na década de 90.

Mas e Benjamin, o que foi feito dele após as filmagens? A sua vida, na verdade, foi muito curta no pós-Lampião. Ele foi assassinado alguns meses depois. E se há muitas informações desencontradas sobre a vida de Benjamin Abrahão Botto, há ainda mais a respeito da sua morte. O escritor Araujo chegou a conversar com um delegado, Enésio Mariano, que estava na casa ao lado da qual Benjamin foi morto.

“A morte dele foi um tanto quanto confusa. O que se sabe é que ele mantinha relações com a mulher do sapateiro, que era deficiente. Mas o Benjamin também tinha filmado o Lampião, pessoas importantes que tinham relacionamento com Lampião, e eu acho que essa foi a causa da morte dele. Como ele mantinha relacionamento com essa mulher, não sei até onde foi que colocaram na cabeça do sapateiro que ele precisava dar um fim no Benjamin. O genro e o filho do sapateiro mataram o Benjamin com 42 facadas”, diz Araujo.

O escritor Aymoré também desconfia da versão da morte por ciúmes e afirma que considera a versão de que foi a própria polícia a autora do crime a mais plausível. “O governo federal estava muito empenhado na captura do Lampião. Eles (os policiais) consideraram aquilo uma desvalorização, um cidadão estrangeiro vai e filma Lampião e os policiais não conseguem se aproximar”, explica o jornalista e escritor.

Dos demais detalhes da vida de Benjamin há poucos registros históricos. Teria vindo da cidade de Zahlé, diz Araujo. Também há notícias de que era muito simpático e até mulherengo. Uns dizem que era solteiro, outros que era casado e que teve até um filho. “Segundo se conseguiu saber, ele realmente tinha vocação para o cinema, tinha uma paixão pelo cinema e queria fazer disso uma profissão, ele tinha o sonho de ser cineasta. Essa versão, aliás, foi confirmada pelo filme Baile Perfumado”, diz Aymoré.

Publicado originalmente em: ANBA

Achei pescando no Açude do: LUIS NASSIF

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Parceiros indispensáveis

O cangaço e os cães 
Por: Eulália Jordá Poblet


Caiu-me nas mãos um livro divino, “Cangaceiros”, de Élise Jasmin.

Acariciando suas páginas lisas e brilhantes, vi surgirem fotos que decifram um pouco do que pode ter sido a vida de pessoas e animais que o vento levou em meio à aspereza da caatinga.

De uma das fotos, próxima a árvores mirradas e sofridas, Maria Bonita olha para a câmara do fotógrafo Benjamin Abrahão. Sua figura de mulher, sem dúvida a mais emblemática do cangaço, é de beleza excepcional para a época, qualidade que deve ter encantado Lampião.

Famosa por sua coragem e determinação, lá está ela, trajada com um vestido citadino ao invés das tradicionais vestimentas do cangaço, cabelo alisado com banha cheirosa onde dois passadores brancos são o maior adorno – tão humana em sua vontade de se parecer aos habitantes da cidade. Fitando a câmara, seu olhar é de doçura.





Atribuo essa suavidade em seus olhos ao fato de estar ladeada por dois cães cuja animalidade paradoxalmente humaniza a atmosfera de rifles, madeiras mortas estendidas no chão e galhos retorcidos. Farejo carinho no ar que envolve esses personagens.

Um dos cachorros, de nome Ligeiro, é seu preferido. Com a mão direita a mulher toca sem peso a cabeça marrom clara, que com ar de beatitude canina encima duas patas brancas e um focinho escuro, demonstrando visível prazer em encostar-se nas pernas de sua dona, amiga e espécie de mãe – naqueles cafundós, filhos humanos não dariam conta de acompanhar o grupo.



A mão esquerda repousa lânguida sobre o dorso negro de outro cão, Guarani, que no momento do disparo da máquina, se vira para Lampião. O movimento em direção a esse rei das cartucheiras, punhais e fuzis é tão independente e real que sua cabeça fica registrada na foto como algo impreciso, ligeiramente fora de foco. O animal dá a impressão de um moto-contínuo reproduzindo exaustivamente a vida daquele instante na guinada eternizada.

Em outras duas fotos sequenciais, vejo o bando de Corisco, armado até os dentes em evidente pose. Apenas a cadela não posa. Sua naturalidade, para quem está em primeiro plano, contrasta com o da fileira quase militar das pessoas ao fundo.




Na primeira foto, ela olha para a câmara com seu corpo branco manchado de negro como negra é a máscara que possui ao redor dos olhos. Na segunda, olha para o bando como se a presença do fotógrafo, tão ilustre naquela região desolada e espinhenta, não tivesse tanta importância quanto a dos “seus”.

Em mais uma fotografia, Corisco apresenta-se em posição clássica de sentido ao lado da mesma cadela. Esse homem cuja única linguagem parece ser a da violência, tem sua inscrição na história amenizada pelo amor dessa cachorra por seu relampejante ser-humano-corisco. Ela o tem como o chefe do bando, e ele, curiosamente ao ser o local tão árido, a chama de Jardineira.


Jardineira surge assim como a antítese da morte em meio ao mato seco, representando a beleza e poesia que os cães, com seu companheirismo, independente de quem somos, tão bem nos sabem outorgar.


*Eulália Jordá Poblet é Médica pós-graduada em doenças parasitárias e infecciosas e membro da Sociedade Protetora dos Animais de Minas Gerais
 

Açude:Metro.org

terça-feira, 25 de maio de 2010

Múcio Procópio:

Conversas pelo sertão afora

Por: Maria Betânia Monteiro - Repórter / Foto: Alex Régis

Pesquisador Múcio Procópio volta a Canudos nos próximos dias

Que o samba foi criado no Rio de Janeiro, todo mundo sabe. O que pouca gente sabe é que foram os nordestinos, os responsáveis pela transformação do Lundu – gênero musical africano – nos mais brasileiros dos ritmos, o Samba. Quem conta esta história é o jornalista Múcio Procópio, bancário aposentado e pesquisador autodidata aqui do Estado. Especialista em movimentos sociais brasileiros, Múcio percorreu as trilhas deixadas por Antônio Conselheiro e acabou descobrindo a verdadeira origem do samba e da Guerra de Canudos. Às vésperas de mais uma de suas viagens à Bahia, Múcio conversou com o VIVER sobre o trabalho que vem fazendo com suas palestras pelos sertões afora.

O pesquisador percorre desde 1979 os caminhos de grandes nomes, como Luiz Gonzaga, Lampião, Padre Ibiapina (líder político e espiritual da Bahia), Delmiro Gouveia (comerciante alagoano), dentre outros ilustres nordestinos, com o objetivo de coletar informações para depois divulgá-las em diversas comunidades. “Se as pessoas tivessem consciência do que são, sofreriam menos”, disse Múcio. Inspirado em Antônio Conselheiro, personagem histórico de maior relevância em suas pesquisas, o jornalista andou por todo o país coletando e divulgando informações preciosas, num trabalho missionário em favor do esclarecimento.

Fazendo uso quase que exclusivo da transmissão oral, o pesquisador profere palestras em universidades, escolas e demais instituições fomentadoras do conhecimento. Na semana passada, Múcio foi um dos palestrantes do Forró em Debate, no Forró da Lua da fazenda Bonfim, ao lado de Biliu de Campina e outros palestrantes.

Agora, o pesquisador anda às voltas com a história do samba. Segundo ele, os combatentes nordestinos da Guerra de Canudos povoaram os morros do Rio e criaram o Samba.

Ele conta que a origem de tudo foi uma promessa não cumprida do então presidente Prudente de Moraes. Segundo Múcio, ele teria oferecido aos homens desempregados de todo o Brasil, um emprego no que viria a ser o exército brasileiro. A primeira batalha desses homens pobres, em sua grande maioria ex-escravos, foi a Guerra de Canudos. Eles passaram onze meses em combate e depois se dirigiram ao Rio de Janeiro para cobrar do presidente a promessa de emprego.

Os ex-combatentes não receberam o prometido e montaram suas casas nos morros da periferia carioca. “Muitos destes homens ainda cantavam, tocavam e dançavam de saudade da África. Eles traziam em seu repertório o Lundu”, disse o pesquisador. Esses homens negros se encontravam para tocar, nos vários terreiros erguidos nos morros do Rio.

O número de freqüentadores dos terreiros aumentava, ao passo que eram inseridos novos instrumentos e novos ritmos, o que resultou, em pouco tempo, nos batuques e nas umbigadas, que posteriormente evoluíram para uma das trinta variações do Samba “carioca”.

Um dos terreiros mais frequentados na época era o da Tia Ciata, baiana que ganhava a vida vendendo acarajés e outras iguarias de origem africana. Em sua casa passaram os precursores do samba, como Donga e Mário de Almeida, que lançou o vinil chamado “Pelo Telefone”, produzido pela Casa Edson em 1917. Outros Sambas haviam sido gravados, mas o sucesso de Pelo Telefone foi tanto, que o disco passou a ser considerado o marco na popularização do ritmo brasileiro.

Apesar da grande influência de Tia Ciata e do sucesso do disco Pelo Telefone, o Dia do Samba é comemorado para marcar a visita de Ary Barroso à Bahia, em dois de dezembro em 1940.

Coleta de novos dados

A viagem para a cidade de Canudos, no interior da Bahia tem como propósito a coleta de novos dados para incrementar a pesquisa sobre a Guerra de Canudos e os seus desdobramentos. Múcio tem um dos maiores acervos no Estado sobre a Guerra de Canudos e sobre os seus atores. São ao todo 193 livros, 200 folhas de jornais, 38 artigos, além de revistas e outros materiais sobre Canudos, Antônio Conselheiro e Euclides da Cunha.

Múcio pretendia no início de suas atividades na década de 1970 ir as comunidades para falar sobre a formação de consciência crítica, o que segundo o pesquisador não deu certo. “O título amedrontava as pessoas”, disse Múcio. O pesquisador optou por falar de temas periféricos, como rebeliões sociais, que culminavam no mesmo lugar: fomentação da consciência crítica. “Eu queria que o eleitor não votasse em troca de dez Reais ou pelo acesso gratuito a uma lama cultural qualquer”, disse Múcio. O pesquisador acredita que as pessoas devem buscar informações para que não sejam enganadas por discursos de camelô.


Publicado originalmente no Caderno "Viver" - Jornal Tribuna do Norte, em 04 de Maio de 2010.
Acesse:Tribuna do Norte


 Messianismo também é vossa paixão?
Pois Zé Lourenço e Antônio Conselheiro se encontram no Cariri Cangaço 2010. 
Na abertura de seu segundo dia, 18/08 na Capela de Santo Inácio de Loyola, no Sítio Caldeirão do Deserto, Crato-CE, a partir das 9:30 H, teremos as Conferências: Religiosidades, Memórias e Movimentos Sociais, com o professor doutor, Lemuel Rodrigues, e a Conferência: Antônio Conselheiro – O Perfil, com o pesquisador e professor Múcio Procópio.
Mais detalhes sobre o esperado evento em nossas próximas matérias.
Att. Kiko Monteiro 

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Jesuino Brilhante

A gruta do cangaceiro Romântico em Patu-RN 
Messier Rostand Medeiros "pincou" o pé na na estrada um dia destes e foi em busca de um dos principais esconderijos de um Cangaceiro pouco pestigiado, nem sequer existem imagens comprovadamente suas, mas que deixou marcas indeléveis na região em que viveu sua saga. Sempre detalhista este pesquisador nos proporciona belas imagens e fatos que marcaram a presença do cabra nesta região potiguar.

 Mapa do Rio Grande do Norte, mostrando no quadrado negro, a localização da cidade de Patu

Gruta da Casa de Pedra de Patu, localizada no Município de Patu, Rio Grande do Norte, devido a sua utilização no séc. XIX como abrigo pelo cangaceiro Jesuíno Brilhante, encontra-se atualmente em razoáveis condições de preservação e com real potencial para a sua utilização dentro do contexto de turismo ecológico. Trata-se de local tradicionalmente citado por vários autores folcloristas e historiadores especialistas em cangaço, que atestam o fato em comento, sendo, porém, a cavidade nunca tendo sido abordada em estudo que integrasse o lado histórico-cultural com o qual denota a sua relevância como parte do patrimônio espeleológico nacional. Este trabalho foi realizado pela ONG SEPARN - Sociedade para Pesquisa e Desenvolvimento Ambiental do Rio Grande do Norte, a SBEC - Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço e a Prefeitura Municipal de Patu.
 
O povoamento esta cidade teve início em 1718, com a concessão de uma sesmaria ao padre Francisco Pinto de Araújo, na Serra do Patu. Mais tarde, em 1742, o Capitão Leandro Saraiva de Moura destacava-se como proprietário de Patu de Fora, e, posteriormente, do Sítio Boqueirão no ano de 1755. A primeira residência da localidade foi construída pelo Sr. Raimundo Basílio.

 

 Maciço rochoso granítico da Serra do Lima. A cidade de Patu fica na base desta elevação.


O principal destaque no início da criação de Patu foi o Coronel Antônio de Lima Abreu Perreira, Comandante do Regimento de Ordenanças da Ribeira do Apodi, na Serra do Patu, que no ano de 1758, fez doação de terras para a construção da Capela de Nossa Senhora dos Impossíveis, erguida na majestosa serra que ficou conhecida como a Serra do Lima. No dia 25 de setembro de 1890, através da Lei nº 53, Patu desmembrou-se de Martins, tornando-se município do Rio Grande do Norte.
 

 Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores.

Motivados pelo convite para integrar uma equipe mista envolvendo a Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço - SBEC e representantes do Município de Patu/RN, a Sociedade para Pesquisa e Desenvolvimento Ambiental do Rio Grande do Norte - SEPARN, em abril de 1998, iniciou uma série de levantamentos científicos iniciais na Casa de Pedra de Patu e seu entorno, tendo as pesquisas sendo repetidas em viagens ocorridas em fevereiro de 2002, março e maio de 2005, junho de 2007 e setembro de 2008.  
Nessas oportunidades se teve a chance de avaliar as condições de preservação do local, alvo de irregulares visitas que terminam por depredar o ambiente, e também produzir mapeamento topográfico do interior da cavidade, auferir sua posição exata, produzir estudos sobre a geologia da área, além de lançar as bases e diretrizes para elaboração de plano aproveitamento turístico racional da área.
 

A gruta está localizada na Serra do Cajueiro, no imóvel Fazenda Cajueiro, propriedade rural às margens da RN-078 distante 5,6 Km do centro urbano, proprietário Sr. Jorge Pereira de Castro, que responde na região por Jorge Baiano. Durante o período do ciclo do algodão no Nordeste, mais de 150 famílias chegaram a viver na propriedade, sendo um importante centro local. Atualmente ainda existem as benfeitorias da época como casa sede, capela, currais, casas diversas etc.
 

A história do cangaceiro Jesuíno Alves de Melo Calado (1844-1879), o Jesuíno Brilhante, está associada à Casa de Pedra de Patu por influências familiares, uma vez que o descobridor da gruta foi seu tio materno, José Brilhante (1824-1873), vulgo "Cabe", sendo que quando o cangaceiro passou a utilizar o local, fê-lo pela indicação do parente.
 

 Casas principais da fazenda Cajueiro. Todas com mais de um século.

A pouca bibliografia existente sobre a vida de Jesuíno Brilhante conta que o velho cangaceiro José Brilhante, Cabe, teria cortado uma grande mata para chegar até a entrada da gruta. Trata-se de um local estratégico e seguro esconderijo, principalmente devido à sua altitude média, dando visão de todo o vale, e ao difícil acesso, fatores que criavam uma imensa vantagem aos cangaceiros, pois eles tinham a total movimentação de seus potenciais perseguidores sem serem vistos, numa evidente vantagem tática.
 

 Caminhos utilizados na região de Patu.

Inúmeras informações foram colhidas da tradição oral dos moradores da região e da associação entre tais fatos e as práticas comuns daqueles que viviam da vida do cangaço. O fato de existir uma saída lateral pela remoção de blocos graníticos é tido como uma intervenção do morador/cangaceiro da gruta, que o fez para lhe proporcionar uma segunda saída do local em caso de emboscada.
 

 Serra do Cajueiro, na verdade uma continuidade geológica do maciço rochoso da Serra do Lima.

Na gruta não estão caracterizados sinais evidentes de ocupação por indígenas, mas nada impede vistos os mesmos nas redondezas e o fato de a cavidade ser um abrigo natural próximo à água.
 

Os elementos que apontam a entrada de Jesuíno Brilhante na vida do cangaço são os comuns como a injustiça social, perda da posse da terra, afronta aos valores socioculturais ligados ao meio, e consequências do fenômeno das secas. Até 1871 Jesuíno trabalhou como lavrador e vaqueiro. Era casado e possuía cinco filhos. Porém seus problemas tiveram início com o roubo de alguns de seus caprinos, fato atribuído aos seus vizinhos, a família Limão.
 

Não bastasse o sumiço dos animais, alguns dias após o acontecido, um irmão de Jesuíno foi agredido por um dos da família Limão na feira da então Vila de Patu. Movido pela defesa da honra matou o agressor de seu irmão e com poucas alternativas à sua disposição, tornou-se o cangaceiro mais famoso do Rio Grande do Norte.
 

Perseguido, seu principal refúgio era a gruta, escondendo-se com o seu bando e sua família, tendo travado diversos combates com policiais. Nunca foi capturado no local, tendo sido morto na Paraíba em 1879, no sítio Riacho dos Porcos, do município de Brejo do Cruz (PB), morreu em combate, aos 35 anos de idade.
 

 A trilha de acesso a uma fonte de água e a cavidade. 
 
São diversos os escritores e pesquisadores do fenômeno do cangaço atestam a utilização desta gruta por este cangaceiro, dentre eles Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) com o seu livro "A Flor de Romances Trágicos".

 
 Contudo, a primeira literatura publicada que faz, inúmeras vezes, alusão a esta caverna, é a do escritor cearense Rodolfo Teófilo (1853-1932) com o seu romance, "Os Brilhantes" de 1895. Depois vieram outros literatos, escritores e pesquisadores como Eloy de Souza (1873-1959), Gustavo Barroso (1888-1959).
 
 No local do olho d’água encontramos esta árvore marcada por disparos. As pessoas da região afirmam terem sido produzidas pelos cangaceiros. Mas esta versão, sem uma análise mais apurada, não pode ser confirmada.

Em 19 de janeiro de 1969, o escritor Raimundo Nonato (1907-1993) visitou a caverna com a intenção de coletar dados mais fidedignos para a realização do seu livro "Jesuíno Brilhante - O Cangaceiro Romântico".
 

O escritor Raimundo Nonato relata o quanto foi difícil o acesso e compreende a razão do cangaceiro haver resistido a várias incursões de forças do governo, dentre estas uma comandada pelo então oficial de polícia e futuro senador e ministro Amaro Bezerra Cavalcanti.
 

 

 Em 2005, este foi o estado em que os membros da SEPARN encontraram a entrada da gruta. As maiorias das pichações foram feitas com carvão e corretivo branco, modelo escolar.

Já a literatura de cordel versa muito pouco sobre o assunto, já que os poetas populares fixaram-se na figura do cangaceiro e sua vida de lutas, deixando muitas vezes de referir-se ao seu esconderijo.
 

 No interior da gruta encontramos estas duas estacas de baraúna. Segundo o pessoal da região, estas estacas estão aqui desde o tempo do cangaceiro Jesuíno Brilhante e serviam para armar uma rede. Posso garantir que desde 1998 elas estão lá, já se foram colocadas na década de 1870, aí é outra história.


Não existem registros fotográficos de Jesuíno Brilhante, contudo a sua caverna-esconderijo está muita bem conservada e é o símbolo mais importante de suas aventuras e desventuras. Restou fama de cangaceiro romântico, que não desonrava as senhoras, supostamente roubava dos mais ricos e doava aos mais pobres e protegia os sertanejos dos abusos dos coronéis.
 


Na Serra do Cajueiro, desde a base até as altitudes mais elevadas, existem abrigos criados pelo rolamento de blocos de granito. Estes blocos são formados devido ao intemperismo e falhamentos que atuam na rocha. Um destes abrigos é a caverna de Jesuíno Brilhante.
 
Durante da visita conjunta SEPARN, foi realizada uma topografia preliminar que definiu como área total de progressão da caverna de 60,46 metros, desnível de 6,72 metros, extensão norte a sul de 14,64 metros, extensão leste a oeste de 14,22 metros e altura média de 2 metros. As seções transversais são irregulares, pela acomodação dos blocos. Sua localização em coordenadas geográficas em UTM ficou definida em: área 24 648736E 9319399N. Da sede da propriedade para a caverna percorre-se uma distância de 1.800 metros. 
No alto da Gruta do Cangaceiro Jesuíno Brilhante, em 2008, ano de muita chuva. O cenário aponta em direção à sede da fazenda Cajueiro. 


Abraços 
Rostand Medeiros 

Vídeo Game do Cangaço!

No mesmo estilo de Counter Strike, só que aqui o cenário é o nordeste brasileiro, você fará parte do cangaço.


Pense num jogo porreta...! Para adentrar nesta saga épica tem de mostrar que é um cabra merecedor, um cabra da peste! É, o jogo é todo ambientado em uma terra mágica, mais até que bem real, o Nordeste brasileiro. Pois é, o povo vive em meio ao sertão, ao semi-árido, e é ali em meio a caatinga que você terá de reunir suas forças para lutar por melhores condições de vida e derrotar um exército de jagunços.


Então, tá esperando o quê homem? É a sua chance de encarnar o espírito que rege os valentes da região, Virgulino Ferreira, o Lampião, rei do cangaço. É hora de calcar suas botar, armar a espingarda, ou a garrucha, e com coragem ir enfrentar os soldados mixurucas que querem proteger o governo. Jogue Nevrose e sinta essa adrenalina.

O que não pode é essa cambada toda sair imune. Ora mais, vê se pode, meu Padim Padre Cícero, esse povo todo ficar sofrendo na mão dessas autoridades desavergonhadas. Então homem, você não pode deixar essa história sair barato assim, esgueire-se pelos becos da cidade, e arme uma cilada para encurralar essas pestes.

Você vai se sentir em meio a Guerra dos Canudos ou mesmo no filme O Alto da Compadecida. E principalmente fazer parte de um povo sofredor, mais alegre e destemido que nunca baixa a cabeça para as dificuldades. Faça o que estiver ao seu alcance para aniquilar o maior número de soldados que conseguir.


A história de Nevrose foi toda construída com base em uma lenda que já tem mais de 10 mil anos. O conto diz que há muito, muito tempo atrás, um homem encontrou uma pedra furada nos sertões do Brasil. Passado algum tempo ele finalmente conseguiu decifrar seu segredo. Então, tudo que ele almeja agora é reunir o maior número de seguidores para conseguir colocar o tal ritual milenar em prática.

Se você já era fã de Counter Strike, não pode perder a oportunidade de experimentar a mesma emoção só que de uma forma bem mais patriótica. Trata-se de um game no mesmo estilo, o de tiro em primeira pessoa. Logo, os comandos são apenas para frente, trás, lado esquerdo e direito, utilizando-se das teclas W, S, A e D respectivamente. Já ao desejar recarregar sua espingarda use a telcla R. Finalmente para atirar o botão direito do mouse e para mirar movimente-o.

Game não é minha praia, nem experimentei, mas se você curte ou ficou curioso Acesse o link disponibilizado pelo ZIGG: CLIQUE AQUI para Download do aplicativo e boa diversão.

Dramas dolorosos do Nordeste

Notas sobre a grande seca de 1932 

Por José Romero Araújo Cardoso (*)

A grande seca de 1932 iniciou-se de fato em 1926, com um breve intervalo em 1929, tendo se configurado em verdadeiro cataclisma sócio-econômico na região nordeste nos anos seguintes, atingindo o ponto culminante no ano que a imortalizou, cuja calamidade fez com que o flagelo, tantas vezes repetido, assumisse proporções devastadoras, principalmente para a população carente.

Retirantes da Seca de 1932
Fonte:professorfranciscomello



Sob os auspícios do Ministério de Viação e Obras Públicas do Governo Provisório de Vargas, dirigido com decisão férrea pelo paraibano José Américo de Almeida, reiniciaram-se os trabalhos de açudagem no sertão. Obras paralisadas desde a década de 20 foram então progressivamente retomadas, tendo em vista que a confiança de Epitácio Pessoa nas oligarquias, enquanto condutora das obras públicas, fazendo valer as prerrogativas da descentralização político-administrativa da República Velha, não havia surtido nenhum efeito prático, pois na verdade houve avassaladora onda de corrupção.


Ressurgiam velhos projetos, paralisados desde a gestão de Arthur Bernardes (1922-1926), dos açudes como o Itans, o Gargalheira e Lucrécia, no Estado do Rio Grande do Norte, Boqueirão de Piranhas, São Gonçalo e Condado, no Estado da Paraíba, sendo que este último não constava na idealização original, inserido, com certeza, graças à intervenção de Ruy Carneiro, oficial de gabinete do Ministro de Viação e Obras Públicas, e Lima Campos, no Estado do Ceará, entre outros.

Flagelados da grande seca foram aproveitados nas obras que o Ministério de Viação e Obras Públicas implementava nos Estados Nordestinos. Multidões se formaram nos canteiros de obras, a grande maioria sem a mínima noção de higiene, sendo responsáveis pelo acúmulo de lixo e dejetos humanos em escala gigantesca.

O regime alimentar, composto basicamente por farinha e carne seca, agravou o quadro de desnutrição crônica da população flagelada, aumentando ainda mais a possibilidade de acontecer um surto epidêmico.

No final de dezembro de 1932, quando as chuvas finalmente começaram a cair no Nordeste, o inevitável aconteceu através de um impressionante combinado de infecções que Orris Barbosa, em célebre e clássico livro intitulado "Secca de 32 - Impressões sobre a crise nordestina", distinguiu como sendo do grupo coli-tífico-desintérico. Em janeiro, fevereiro e março de 1933 as cifras da mortandade entre os "cassacos" alcançavam números impressionantes.

Proliferação de moscas em verdadeiros enxames contribuiu acentuadamente para disseminar os germes causadores de doenças gastro-intestinais. Em pouco tempo os campos de trabalho estavam atulhados de cadáveres da desdita da seca do século XX.

Crianças, portadoras de um quadro lastimável de desnutrição, foram as mais penalizadas, registrando a maioria dos óbitos da grande epidemia que assolou o nordeste brasileiro na década de 30.

Em um trabalho de profundo humanismo e comprometimento, foi organizada pelo Ministro José Américo verdadeira cruzada assistencial às pessoas castigadas pelo surto epidêmico, formando a "Comissão Médica de Colaboração à Assistência e Profilaxia aos Flagelados", dirigida pelo Dr. José Bonifácio P. da Costa. O Departamento Nacional de Saúde Pública também formou comissão objetivando "inspecionar as zonas infestadas e determinar as medidas imprescindíveis à profilaxia da região" (BARBOSA, 1935, p. 67-74).

A infestação, assumindo proporções desesperadoras, era um desafio à profilaxia, o que fez com que o Departamento Nacional de Saúde Pública invocasse a participação imediata dos departamentos de higiene dos Estados acometidos pelo surto devastador, iniciando-se um intenso policiamento de focos de moscas e mosquitos.

Gradativamente a peste foi sucumbindo à ação inexorável da competência das ações do Ministério de Viação e Obras Públicas do Governo Provisório de Vargas em prol da debelação de um dos maiores flagelos que já assolou o nordeste, cuja união nefasta com a seca fê-la marca indelével no imaginário popular que ainda guarda na lembrança o grande desafio que foi vencer a maior epidemia que o nordeste foi submetido, de forma inclemente, na década de 30 do século passado.

Bibliografia Consultada:

BARBOSA, Orris. Secca de 32 - Impressões sobre a Crise Nordestina. Rio de Janeiro/RJ: Andersen Editores, 1935

Imagem: Flagelado assistido no Campo de Concentração da Terra de Iracema.

(*) José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo (UFPB). Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente - PRODEMA - UERN. Contato: romero.cardoso@gmail.com.

Cariri Cangaço 2010

Definida a conferência de abertura


Caros amigos,

O Cariri cearense prepara-se para receber a solenidade de abertura do Cariri Cangaço 2010 Coronéis, Beatos e Cangaceiros. Na noite em que comemoramos o aniversário da acolhedora Barbalha, o Teatro Nelory Figueira acolherá a Conferência de abertura da primeira noite do Cariri Cangaço, dia 17 de agosto de 2010.

Antônio Amaury Correia de Araújo, um dos mais respeitados pesquisadores e escritores do universo da temática cangaço, no Brasil; será o responsável pela Conferência de Abertura do Cariri Cangaço 2010.

Antônio Amaury trará a Barbalha, a saga de um dos mais destacados personagens da historiografia do cangaço; José Osório de Farias, ou simplesmente: José Rufino. Teremos a fantástica história do vaqueiro que depois de ser convidado duas vezes pelo próprio Lampião para formar ao lado de seu bando, viria a se transformar no mais terrível matador de cangaceiros da história, sendo o responsável pela morte daquele que seria o último cangaceiro, Corisco, o Diabo Louro, em maio de 1940.

A Conferência de Abertura do Cariri Cangaço 2010, acontecerá na cidade de Barbalha, dia 17 de agosto ás 19:30 H, tendo como Moderador da Mesa de Debates; o professor doutor , Lemuel Rodrigues da cidade de Mossoró; como Debatedores; o documentarista Aderbal Nogueira de Fortaleza; o pesquisador, poeta e escritor de Paulo Afonso, João de Sousa Lima e o professor Honório de Medeiros, da cidade de Natal.

A partir de hoje teremos a satisfação de divulgar para todos os amigos a Programação Completa do Cariri Cangaço 2010 - Coronéis, Beatos e Cangaceiros; você vai conhecer todos os conferencistas, os temas, as mesas de debate e tudo mais que vamos encontrar no Cariri Cangaço, quando agosto chegar.

Tudo isso e muito mais no blog do Cariri Cangaço: www.cariricangaco.blogspot.com

Cariri Cangaço, a história contada como você nunca viu!

domingo, 23 de maio de 2010

Nordeste21

Edição comemorativa nas bancas!
 

Já está nas bancas e livrarias de todas as capitais do Nordeste, a edição número 10, comemorativa de um ano da Revista Nordeste VinteUm, Trata-se de uma edição especial com matérias do melhor quilate, assinadas por jornalistas de escol e que, destarte,mantém a qualidade editorial que queremos preservar.

Abraçando o amigo jornalista Barros Alves. 

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Alí Jaz

Sepultura do cangaceiro Arvoredo 
Por: Rubens Antonio  

O cangaceiro Arvoredo nascido em 1905, aparece citado na literatura como Hortêncio Gomes da Silva, seu nome correto, e menos comumente como Hortêncio dos Santos, nome errado.

Arvoredo deixou uma correspondência a um "coronel" baiano:

“Ilmo sr. Francisco de Souza - Aspiro boa saúde com a exma. Família, tendo eu frequentado uma fazenda sua, deliberei saudando-o em uma cartinha, pedir um cobrezinho. Basta dois contos de réis. Eu reconheço que o sr. não se sacrifica com isto e eu ficarei bem agradecido e não terei razão de lhe odiar nem também a gente de Virgulino terá esta razão. Sem mais, do seu criado, obrigado. Hortêncio, vulgo Arvoredo, rapaz do bando de Virgulino Ferreira, vulgo Lampião.”

Depoimento de Risa Galdina dos Santos Conceição, então com 83 anos, de Jaguarari/BA:


O bando de Arvoredo tava escondido na Serra da Conceição, quando o chefe do grupo resolveu descer pra pegá água. Enquanto isso, dois jovens, o João da Biana e o Cícero José Ferreira, o Xisto. Eles estão na mata à procura duns jumentos que haviam desaparecido. No meio da mata, eles se encontraram com Arvoredo que obrigou eles a segui ele. O cangaceiro ia conduzindo os dois pra mata fechada.

E eles imaginando que a intenção do bandido era conduzi ele até o bando para matá. Começaram a fazer sinal um pro outro para dominá ele. João Biano estava com um canivete e Xisto com um facão. Num momento, João derrubou Arvoredo e começaram a rolar pela caatinga.
Aí, o Xisto tento fugir e o João gritou:
- Se fugir eu te pego depois!

Durante a luta, o cangaceiro tava pesado, todo aparatado. Acabou desarmado e recebeu várias furada de canivete. Os rapazes saem para irem embora quando lembram que precisam levar alguma prova para a polícia. Quando voltam, encontram Arvoredo já de joelho. O qual implorou por Nossa Senhora para não morrer. Mas, depois de arrancar-lhe o patuá que carregava no pescoço, ele foi sangrado a golpe de facão...

Para levar como prova cortaram a mão para mostrar às tropas da policia que se encontravam em Barrinha. Eles se reuniram indo em companhia dos dois rapazes ao local onde estava o corpo, que tava no mesmo lugar. Levaram para o Povoado de Barrinha e que foi é trazido de trole para a sede de Jaguarari.

Eu fui ver o corpo quando chegou na estação. Depois disso, nunca mais eu fui ver pessoas que morrem de acidente, pois fiquei com trauma do que vi. Oh! coisa feia. Sei que tá enterrado no cemitério velho de Jaguarari próximo ao cruzeiro.”
  


Objetos pessoais de Arvoredo
"Os matadores receberam 4 contos de réis.
Acervo de Ivanildo Silveira Colecionador do cangaço 




 Detalhe da placa: 
Acervo de Rubens Antonio

Depoimento de Vicente Romualdo dos Santos, então com 97 anos, de Jaguarari/BA:

"Quando eu morava com papai Felix, em São Miguel, foi quando chegou Arvoredo, Calais com seu bando e começaram a fazer perguntas sobre a polícia volante, a riqueza dos fazendeiros entre outras coisas. Meu pai não deu informações. Então eles pediram para que ele não os denunciasse. Mas ele fez o contrário e a polícia foi atrás deles. Um vizinho, coiteiro do bando, avisou que papai havia denunciado.

Passaram-se alguns dias e Arvoredo morreu próximo a Barrinha [em 26 de maio de 1934]. Após sete dias de sua morte, Calais e seu bando voltou à Fazenda São Miguel encontrando eu e meu irmão na roça de mandioca. Sabendo que os assassinos de Arvoredo são parentes do meu pai e que ele havia denunciado o bando, fizeram muitas perguntas.

Então Calais mandou nos amarrar. Então eu, que me encontrava resfriado, senti um calor subir no corpo, e pedi a Nossa Senhora que me protegesse. Calais percebeu essa reação e mandou me segurar. Juremira foi quem agarrou. Foi então que reagi e lutei com ele até cair os dois no chão.

E então consegui me soltar e correr até a porteira que estava aberta. O bando atirou, mas as balas passaram por eu e só uma pegou na manga da camisa. Pensei que meu irmão havia corrido também. Fui em casa e contei a meus pais. E fui a Jaguarari contar à polícia. Mas, em Jaguarari, não havia soldado suficiente. E o delegado Zé Gringo buscou reforço em Bonfim. E somente no outro dia iriam ao local do acontecimento.

Na mesma noite, eu fui à casa de João Resenaldo, e lá apareceram João Biana, Xisto e outros homens dispostos a irem ao local da luta. Mas não tinham armas. Foram à casa de algumas pessoas. Zé Ferreira, Zé Melado e outras, conseguindo armas, indo até a roça. Chegando lá, encontramos Antônio dos Santos, meu irmão, morto. Estava sangrado, com a boca cheia de terra, para não gritar, com nove facadas no peito e o rosto todo cortado. Eu coloquei ele em cima de umas tábuas no jumento e o levei para casa. E os demais foram procurar os bandidos.

Passado algum tempo, apareceu uma espírita, de Petrolina, trazida por minha sobrinha. Ela entrou na casa pela porta da frente e parou na dos fundos. Perguntou:
– Seu Vicente... Seu irmão que morreu gostava de tomar café?
Eu disse que sim, então ela pediu café em pó e açúcar. Pôs em uma vasilha e colocou brasas. A fumaça tomou a casa. Ela disse que, no canto do alpendre, eu deveria conservar sempre com uma luz, porque havia alguém ali. Após isso, a mulher recebeu o espírito de alguém. Eu ouvi uma batida na parede e a mulher falou:
- Boa noite, ô irmão, sabe quem eu sou?
E eu disse:
- Não.
– Você tá falando com seu inimigo.
E me abraçou. Eu senti que os ossos quebraram-se. A mulher falou:
- Até hoje eu era seu inimigo. Agora sou seu maior amigo. A partir de hoje você só tenha medo dos castigos de Deus, porque dos males da Terra eu lhe livro.

Então eu reconheci. Era Arvoredo. Disse ainda Arvoredo:
- No dia que seu irmão morreu, eu estava lá.
Depois a espírita recebeu meu irmão Antônio. Ele disse:
- Irmão. Aquela era chegada à minha hora. Agora eu vou ver minha mãe.
Outro dia, a mesma mulher voltou até minha casa onde encontrou todos dormindo. Ela chamou:
- Vicente!
Em um dos cômodos, ela recebeu novamente o espírito de Antônio que disse:
- Agora eu vou me libertar... 
Nesse momento vi a mulher colocar grande quantidade de terra pela boca até ficar com a voz limpa. Tempos depois eu fui a Petrolina, à casa da espírita e no Salão de suas consultas. A espírita recebeu doutor Antônio, que perguntou a mim se eu sabia dos benefícios que ele, o doutor Antônio, já fez. Nisso apareceu o esposo da espírita vestido de cangaceiro e tocando sanfona.

A mulher recebe Arvoredo que me chama no salão e coloca as mãos em meu ombro e pede para eu contar como foi sua morte. E depois disse:
- Fui morto por dois meninos... um de catorze e outro de quinze anos... Nunca pensei que o perigo estivesse ali.
Alguns anos depois, a mulher voltou à fazenda de nossa família e pediu para nós irmos ao cemitério para arrumar a cova de Arvoredo. A cova estava funda. Após arrumar a cova, rodearam velas na mesma e acenderam.

Arvoredo apareceu novamente através da espírita. O céu estava fechado. Era época de inverno, parecendo que ia chover. Estava escurecendo. Arvoredo falou:
- Graças a Deus, agora tou liberto... As armas que estavam comigo caíram agora...
O céu se abriu e num clarão ele disse:
- Meu espírito está agora como o céu...
A espírita acendeu vela em todos as covas, mas ao chegar no canto do cemitério não consegue acender em uma carneira antiga. A vela apagava.

Em outra ocasião a espírita retornou ao cemitério na companhia minha e de duas pessoas ajudantes para colocar uma cruz de ferro no túmulo de Arvoredo.

Daí eu sempre acendia velas e rezava um “Pai Nosso” para a alma de Arvoredo. Hoje em dia, estou com dor nas pernas, por causa da velhice. Estou impossibilitado de ir ao cemitério mas oro em casa.”