Por Sálvio Siqueira
Desde o segundo meado do séc. XVIII que o cangaço infestava as terras nordestinas. O Fenômeno Social surgiu na zona canavieira pernambucana e, aos poucos, migra para o interior do Estado das Alagoas numa época denominada na História como “A Era do Couro” e, em sequência, estende-se aos sertões dos Estados vizinhos.
O interior pernambucano, mais precisamente a microrregião Pajeú das Flores, torna-se um verdadeiro celeiro de cangaceiros. Porém, da Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia e do próprio Alagoas, começam a surgir inúmeros bandoleiros por ‘n’ motivos. Nesse tempo, final do Império e início da República Velha, o sertão nordestino estava infestado por esse tipo de banditismo. As autoridades dos vários Estados da Região Nordeste assolados pelos bandos fazem de tudo para darem fim, ou pelo menos diminuírem, esse tipo de criminosos rurais, sem conseguirem seus intentos.
Ocorreram vários fatores que impediram o extermínio dos bandos de bandoleiros naquela época. O contingente das Províncias, depois Estado, não era grande, e o pouco que tinham não poderia enviá-las para o foco do problema para não correrem o risco de ações criminosas nas zonas urbanas que também viviam abarrotadas de problemas inclusive com imigrantes dos interiores. As longas e cruéis estiagens deixavam quase que impossível algum ser humano viver, ou conviver, dentro da caatinga.
Não havia água nem comida disponível para abastecer as tropas.
A comunicação via telégrafo não existia em todo lugar. As volantes sabiam de onde iriam partir, porém, jamais sabiam para onde iriam nem tão pouco quando chegariam a algum lugar habitado. Os governadores até que tentavam, na medida do possível, abastecerem os locais com praças, no entanto, ocorre um grande problema causando o impedimento da continuação dessa ação devido o soldado, formado em outras terras e usando equipamento inadequado, adoecerem, principalmente dos pés ao ponto de não conseguirem prosseguir com as perseguições. A falta de estradas era outro empecilho que as volantes tinham para transporem. E outros problemas mais...
Volante atuando no Estado da Bahia
O soldado não sabia em quem confiar, passando a usar um modo operante totalmente equivocado onde todo e qualquer roceiro eram suspeitos. Com essa maneira errada de trabalhar, em vez de conquistarem os sertanejos, conseguiram foi o seu afastamento e falta de colaboração. Vendo essa insatisfação dos sertanejos os chefes dos bandos usam de tática diferente. Protegendo, ajudando e respeitando vários deles, com outros usaram também a ‘moeda’ de troca de favores. Então começa a surgirem, a se criar, uma malha de protetores e colaboradores onde, mais tarde, essa mesmo é o fator principal da longevidade do Fenômeno Social. Essa “malha” foi alimentada por “favores”, dinheiro e proteção dos chefes cangaceiros. No decorrer do tempo, grandes latifundiários e produtores rurais começam a fazerem parte da mesma, assim como pequenos e grandes comerciantes e até militares. A falta de receberem o seu pequeno soldo, vários soldados desertam da Força Militar e se engajavam aos vários bandos nômades de bandoleiros levando seu fardamento, armas e munição.
Essa pirâmide de colaboradores tem sua maior extensão quando do cangaço implantado pelo chefe cangaceiro Virgolino Ferreira, alcunhado de Lampião, o “Rei dos Cangaceiros”, entre os anos 1918/19 e 1938, segunda personagem mais biografada na América Latina. Lampião não foi o criador da malha de colaboradores nem foi o criador da ‘guerra de movimentos’, mas foi aquele que mais a aperfeiçoou no decorrer de seu cangaço nos contrafortes da Mata Branca, onde tendo a contribuição dessas e outras táticas, conseguiu permanecer por quase longos vinte anos assombrando o sertão nordestino. Porém, como tudo nessa vida tem seu início, meio e fim, na segunda metade da década de 1920, o cangaço começa a sofrer tombos que algum tempo depois o leva ao clímax, ao epílogo de uma era sangrenta, dolorosa e enlutada para os sertanejos.
Os anos considerados mais gloriosos das ações cangaceiras estão entre 1919 e 1927, já na fase do cangaço lampiônico, mesmo haverem, na época, mais de 40 bandos com chefes distintos nos sertões dos Estados nordestinos, o comandado por Lampião destaca-se notoriamente, apesar de entre os anos de 1921 e 1922 a Força Pública pernambucana ter sido uma ‘pedra nas Xô-boi’ dos bandos na região do Pajeú das Flores. Até fins de 1926 e início de 1927 os cangaceiros tinham um ‘aliado’ bastante benéfico: era que as tropas militares em perseguição aos bandos de cangaceiros não podiam transpor as divisas de Estado, legalmente, dando continuação a uma perseguição.
Eurico de Souza Leão |
No plano colaborado pelo “Rifle de Ouro” determinam-se focar as investigações e ações militares na malha colaboradora, roceiros, vaqueiros, militares, fazendeiros, comerciantes e etc.. Até aquele momento todas as tentativas de combaterem o banditismo rural focava-se diretamente em sua figura maior, Lampião. Silvino, tendo sido chefe cangaceiro, sabia que dentro da ‘malha’ de colaboradores existiam aqueles que serviam de ‘pombos-correios’, servindo quase que exclusivamente para levar e trazer recados, notícias e etc.. A coisa estava tão séria que mesmo antes de uma ordem direta para determinado comandante de volante chegar ao mesmo, Lampião já estava ciente da mesma.
Com isso tinha tempo para organizar uma emboscada ou mesmo mudar totalmente sua direção apagando seus sinais. Podemos concluir que a partir daí inicia-se o começo do fim do Fenômeno Social. Logicamente, devido a inúmeros obstáculos surgidos, como por exemplo, uma extensão territorial enorme, colaboradores na alta sociedade e militares de alta patente, leva-se mais de 10 anos para terem o resultado final, para que o laço fosse se fechando objetivando a extinção do Cangaço.
Uma das decisões principais para que se desse fim ao movimento social cangaço, a nosso ver, foi à admissão de sertanejos nas colunas militares perseguidoras. A ‘matéria prima’ para formar-se um cangaceiro era um vaqueiro, um roceiro, um sertanejo nato, homem disposto, sem medrar a nada, nem mesmo a morte, estava pronto para tudo. Além disso, fora forjado em um ambiente duro, cruel, sentindo na pele a selvageria causada pelos homens dos ‘coronéis’ em seus familiares, amigos e conhecidos. Então, quando da decisão de nomear homens do sertão, vaqueiros, roceiros e sertanejos natos, a coisa começou a ficar equilibrada. Havia homens de mesmo ‘quilate’ de ambos os lados e todos eram conhecedores dos perigos da caatinga. Vestimentas, calçados e coragem agora estavam equidistantes. Os comandantes militares locados em diversas cidades interioranas tiveram a ordem de admitir aquele que quisesse fazer parte da Força Pública, aqueles que quisessem ser contratados e ainda de aceitarem a ajuda daqueles que se fizessem voluntários, por ‘n’ motivos, para darem combate aos cangaceiros. Aí passou a ser “cobra engolindo cobra”.
Lampião, em princípios de 1926 é convocado para fazer parte do Batalhão Patriótico, medida tomada pelo Governo Federal com o intuito de dar combate a “Coluna Prestes” em vários Estados da Nação, situado na cidade de Juazeiro do Norte, CE. Virgolino recebe a patente de Capitão Provisório dos Batalhões Patrióticos, consequentemente, seu Estado-Maior também recebe suas devidas divisas militares. Além disso, a agora ‘tropa militar’, recebe dinheiro, uniformes e equipamento bélico de alta precisão para a época. O bando de Lampião torna-se tão forte que em novembro daquele mesmo ano, no local chamado Serra Grande, no município de Calumbi, PE, causa a maior derrota até hoje registrada a Polícia Militar de Pernambuco. Porém, essa vitória deixa o chefe mor do cangaço bastante afoito, fugindo notadamente de sua maneira de agir, e no primeiro meado do ano seguinte sofre grande derrota em terras potiguares.
Fugindo com o rabo entre as pernas, o bando do “Rei Cego” a cada investida das Forças Públicas de vários Estados vai diminuindo rapidamente. Tanto que no segundo meado de 1928, contando apenas com cinco homens, migra para terras baianas onde remonta seu império do terror. A maneira de Virgolino agir, suas táticas empregadas, sempre chamou atenção até entre seus perseguidores e inimigos. Sempre planejando antes de agir, causa grandes baixas nas fileiras das colunas militares que sai em sua perseguição.
Logicamente não se tratava apenas de táticas no campo de batalha, também havia aquela usada junto aos colaboradores, principalmente aqueles que tinham o dever de persegui-lo.
Ficando um bom tempo na ‘moita’, Lampião começa a conquistar os baianos. Aos poucos vai recrutando e aumentando, novamente, o contingente de seus asseclas. Porém, Lampião depois de algum tempo, sai da Bahia e vai instalar-se em terras sergipanas, ficando o território baiano como zona de ataques periódicos. No início dos anos 1930, “O Cocho” toma uma decisão fantástica em termos de guerrilha: divide seu bando em pequenos grupos e cada grupo com seus respectivos chefes. Com isso as Forças perseguidoras ficam um tanto desbaratinadas sem saberem ao certo quando, realmente, estavam dando combate ao cangaceiro mor do Pajeú das Flores. Essa ação deixa até os jornais, meio único de comunicação em massa na época, desnorteados e, automaticamente, seus leitores. Há, nos arquivos de vários periódicos, ações noticiadas de em um mesmo dia, em cidades distintas e longe uma da outra, praticadas pelo “Rei do Cangaço”. Quando na verdade eram praticadas por asseclas daqueles pequenos grupos.
Após as pancadas que levou no lombo no decorrer da década de 1920, seu primeiro decênio de reinado, o terceiro filho de José Ferreira já no envelhecer do corpo físico, mantem-se mais nos acampamentos. Entre fins de 1936 e início de 1937 até meados de 1938, quando de sua morte, Lampião passou a comandar diferentemente seus cabras. Nessa fase, o “Rei Cego” passa quase que exclusivamente a executar os famosos bilhetes de extorsão e enviar cangaceiros e coiteiros de confiança para que trouxessem mantimentos, armas e munição. O chefe cangaceiro distribui entre a população, nessa época, seu ‘passaporte’ de livre passagem. Para se transitar pelo sertão fazia-se necessário pagar um percentual ao neto predileto de dona Jacoza, ou corria o risco de enfrentar a boca de um fuzil ou a ponta de um punhal. E não eram apenas os ‘pequenos’ que sofriam de imposição, os grandes produtores, industriais, fazendeiros e latifundiários também faziam parte das ‘colaborações’.
“(...) No atacado, no plano dos grossos capitais, houve o caso exemplar da fábrica de tecidos da Pedra, em Alagoas, cujo caminhão somente teve a jornada diária garantida, as cargas não mais deixando de atingir a ponta do trilho da Great Western em Rio Branco, (Arcoverde) Pernambuco, a cada dia, quando o gerente, José Borba, despiu-se dos escrúpulos e sentou à mesa discretamente com Lampião, lá mesmo na vila alvíssima do finado coronel Delmiro Gouveia, em meio a goles de uísque. Onerada a folha da empresa em um conto de réis por mês, o sossego fez-se total. Negócio bom é o que interessa a ambos os lados, devem ter pensado industrial e cangaceiro (...).” (MELLO, pg 251, 2012)
Alguns jornais começam a prestar um serviço digno para a população e com isso começa a ‘balançar’ o poder daqueles que tinham as ‘rédeas do poder nas mãos’. Outros, pensando apenas em vender seu produto, até inventar inventam notícias sobre o que ocorria nos sertões dos Estados: na aurora de 1938 o jornal Diário de Notícias, da cidade soteropolitana, Capital do Estado da Bahia, noticia a morte de Virgolino Ferreira. O cangaceiro mor teria morrido vítima de tuberculose em sua própria cama. Hoje podemos até darmos risadas de uma notícia dessas, porém, naquele tempo as coisas eram por demais sérias, tanto que a notícia é postada pelo jornal nova-iorquino New York Times, onde disse: “O fora da lei número um morre em sua cama, no Brasil”. (MELLO, pg 270, 2012)
De uma ou de outra forma os Jornais levaram as informações ao público. Em fim, prestando excelentes serviços. Tanto que a população dos grandes centros urbanos começa a exigir mais e eficientes ações das autoridades. Alguns vespertinos, já tendo o povão ao seu lado, começam a ‘apertar’ o nó de cânhamo no gogó de alguns chefes militares envolvidos diretamente com as ações no combate ao banditismo rural. Nas Alagoas o alvo é diretamente o comandante do II Batalhão, major, na época, José Lucena de Albuquerque, em Pernambuco a coisa recai no lombo do tenente Luís Mariano da Cruz, ‘sucessor’ de Manoel de Souza Neto que havia deixada a Força Volante voluntariamente em janeiro de 1936.
O oficial pernambucano, tenente Luís Mariano, natural do município de São José de Belmonte, PE, é tido como um dos grandes e valorosos oficiais que deram combate aos cangaceiros. O comandante pernambucano, sendo entrevistado por um repórter do Diário de Pernambuco em fins de 1937, diz: “Lampião faz uso dos seus retratos como salvo-conduto, que ele autentica com sua firma e entrega às pessoas que lhe pagam determinado tributo e ao grupo, e que lhes prestam completa lealdade e obediência (...) nesses últimos tempos, tem-se embrenhado nas caatingas do Estado de Sergipe e se demora principalmente nos município de Porto da Folha, Simão Dias, Aquibadã, Gararu e Frei Paulo, sendo nesse último município que o bandido-chefe fez, com certa segurança, o seu quartel-general.
De quando em vez, Lampião, à frente de uma parte de seu grupo, invade a Bahia, entrando ali pelos municípios de Jeremoabo, Cícero Dantas e Paripiranga, que separam os Estados da Bahia e Sergipe. Nessas excursões, pratica grandes roubos e depredações, e retorna aos lugares que lhes servem de coito, onde descansa por meses oculto, guardado por coiteiros de sua absoluta confiança(...).”
Já o periódico “Gazeta de Alagoas”, em sua edição de 9 de julho de 1937, usando um pseudônimo chamado de “Sertanejo”, ataca diretamente o comandante do II Batalhão localizado em Santana do Ipanema, AL, “... alguma de lamentável venha ocorrendo no policiamento feito por alguma volante”, cobrando-lhe, antes e depois, maiores resultados nas ações contra o banditismo. Passa-se mais de trinta dias para que o major Lucena desse uma resposta, em 5 de agosto daquele ano, jogando toda a culpa nas costas dos coiteiros: “... se encontram naturalmente nos coitos, amparados e recebendo munições(...) de modo algum prestam auxílio à polícia.” Citando ainda que as Forças de Combate “trabalham com uma única esperança: a casualidade”. O comandante Lucena se ver tão apertado que se dirige diretamente, através de um boletim/telegrama, ao comandante-geral coronel Teodureto Camargo do Nascimento o qual o jornal Folha de Maceió consegue e o publica, na íntegra, em sua edição do dia 13 de agosto de 1937:
comandante Teodoreto Camargo do Nascimento
“Sipanema – Pls. 93-91, data 11, Hora 11h10, Cel. Teodureto – Reg. Policial Militar, Maceió
Estou posse recorte jornais contendo acusações ação força contra banditismo. Não me admiro isto parta Mata Grande, onde há maiores coitos bandoleiros. Vislumbro bem quais responsáveis artigos, os quais, antes 1930, acoitavam cangaceiros e hoje, mais criminosamente ainda, o fazem. Tais autores deviam, antes de mentir, se preocuparem com misérias deles próprios. Fique pois, digno comandante, tranquilo que saberei cumprir meu dever. Vou responder artigos jornais, pois estou disposto aceitar luta. Saudações – José Lucena de Albuquerque Maranhão, major comandante II Batalhão.” (MELLO, pg 260. 2012)
Depois dessa postagem da “Folha de Maceió”, o “Sertanejo”, através das páginas da “Gazeta de Alagoas”, compra a briga definitivamente e desce o ‘cacete’ no comandante do II Batalhão. Em 18 de agosto, dirigindo-se diretamente a José Lucena, diz: “devia estar em Mata Grande, com seu trabalho, não em Santana do Ipanema”. Referi ainda sobre os criminosos citados pelo major, “criminosos de antes ou de depois de 1930, que tudo seja apurado!”.
Rapaz, depois dessa Lucena fica vendo as saídas se fechando. Apertado, redige imensa carta e envia-a ao jornal que a posta no dia 21 do mês. Nessa carta o major tenta argumentar sobre uma ‘possível’ colaboração de seus subordinados aos cangaceiros: “...quem luta com quatrocentas naturezas espalhadas em todo sertão, por mais que seja rigoroso será surpreendido, vez por outra, com irregularidades de subordinados”. Para nós, há uma concordância em que alguém da corporação, ou mesmo alguns militares, colaboravam com os cangaceiros. O rebu é grande e a população fica na expectativa das providências que serão tomadas pelas autoridades. Porém, só em outubro é que o governador de Alagoas, Osman Loureiro, lança na Gazeta de Alagoas sua determinação de que o II Batalhão permanecerá em Santana do Ipanema.
No dia 11 de novembro daquele ano, Getúlio Vargas, através do Decreto nº 19.398, dissolve o Congresso e dá um golpe no regime que o colocou no Palácio do Catete, implantando uma Ditadura, O Estado Novo. São criadas as Delegacias de Ordem Política e Social, linha dura, e é decretada a pena de morte gerando grande impasse nos redutos advocacionais. O Decreto-Lei 88, sobre a novíssima LSN, Lei de Segurança Nacional, em seu Arti. 122, inciso 13, alínea f, rezava claramente que seriam tomadas medidas radicais no “homicídio cometido por motivo fútil ou com extremos de perversidade”. Logicamente esses termos eram dirigidos para aqueles contrários ao Novo Regime e aos bandos de cangaceiros e seus colaboradores, nunca para as perversidades praticadas pelas volantes. O sociólogo Frederico Pernambucano de Mello, diz a respeito: “parecendo mirar o dia a dia dos cangaceiros e de seus protetores. Carapuça certeira. Cabia o alarme entre chefes políticos do sertão. Entre os favorecedores mais eficientes do cangaço, incorrigíveis até ali”.
No início de 1938, o major José Lucena, comandante do II Batalhão em Santana do Ipanema, AL, é convocado para comparecer urgentemente a presença do coronel Teodureto na Capital do Estado:
“(...) o coronel Teodureto ansiava por ter com ele uma conversa reservada, com vistas a “identificar o dedo misterioso que incidia sobre o contexto da campanha (contra o cangaço) e levava àquele resultado deplorável”. Homem enérgico, embora polido, como se impõe a um oficial superior do Exército, Teodureto abre a fala ressalvando “que não punha em dúvida a lealdade e a competência do seu subordinado, mas que precisava descobrir a causa da frustração e eliminá-la custasse o que custasse”. E porque “cumpria restaurar a confiança das populações massacradas pelo cangaço nas providências de governo”, pontuava palavra por palavra, “não abriria mão, a partir de agora, de ação efetiva e ajustada, sob pena de apelar para medidas drásticas e até arbitrárias contra aqueles que fossem apanhados violando suas determinações”. Lucena pouco fala. Ao fazê-lo, já no final, somente lhe acode rememorar o que dissera à imprensa na polêmica de meses atrás: que lhe parecia impossível garantir a honradez de cada uma das quatrocentas individualidades que comandava no sertão. E deixa o Regimento policial “tão amargurado, que ruma dali para a catedral, a fim de orar e pedir a Deus ânimo e luzes para se safar do sério embaraço em que se via metido”. (MELLO,pgs 268 a 269. 2012)
A partir daí, já vinda desde o Palácio do Catete, a ordem de acabar com Lampião vai passando de esfera em esfera de comando. Cada um que passasse a batata quente para as mãos do seu subordinado imediato. As autoridades lançam panfletos deixando a população ciente de que suas ações tinham carta branca, ou seja, podiam usar as ações que quisessem que o Estado os protegiam. Ocorre uma ruma de gente que deixa seus lugares onde moram e caem no mundo. Outros, já da alta, mudam de lado e começam a serem colaboradores das volantes, outros, porém, não deu tempo e são trancafiados. Mesmo assim alguns gatos pingados, devidos à grana ser alta, permanecem colaborando com Lampião, não outro chefe, apenas ao “Rei dos Cangaceiros”.
Entre os cangaceiros, também há deserções, pois sabiam que o cerco se fechava cada vez mais.
Lampião e Jurity em foto de Abrahão
Aqueles que fizeram parte das fileiras cangaceiras não tinham nenhum compromisso com seus companheiros. Ninguém era por ninguém e cada um que defendesse sua vida particularmente. O respeito e a solidariedade entre eles se baseavam em valores financeiros. Se qualquer um deles tivesse tido a oportunidade de matar o cangaceiro mor, Lampião, para apossar-se de seus ‘bens’, da grana e valores em joias e ouro que levava consigo, com certeza o teria matado. Excetuando-se, logicamente, algumas personagens como Luiz Pedro, na ocasião de sua morte, um Mariano anteriormente, um Gato, Sabino e etc... O cangaço estava prestes a acabar.