Quando Dadá conversou com Rosemberg Cariry
sábado, 4 de novembro de 2023
"O Estado de São Paulo" - 7 de março de 1996
quarta-feira, 1 de novembro de 2023
O cangaço em Sergipe
A Pia das Panelas
*Por Eduardo Marcelo Silva Rocha
Sergipe foi um dos locais mais destacados na metade final da história do cangaço lampiônico. Uma vez que nessas paragens o valente de Vila Bela encontrou pouso e proteção de destacados coronéis da região do São Francisco. Ele pôde se estabelecer, recrutando diversos do povo para encorpar suas hostes.
Lampião ao se radicar na região de SE/BA/AL, alterou o funcionamento de seu grupo, que foi dividido em vários (sub) grupos menores, com áreas territoriais de atuação definida, em um processo de delegação de funções, nomeando chefes de bando em diversas localidades, sendo o mais famoso destes, o cangaceiro Zé Baiano, que atuou na região agreste do Estado, tomando Frei Paulo como uma dessas referências.
Essa tranquilidade, somada ao consórcio com “coronéis” da região, permitiu-lhe diminuir seu ritmo de ação, transformando-se em uma espécie de gestor dos seus delegados: Zé Sereno, Labareda, etc. É óbvio que existiam outros aspectos, como o cansaço daquela vida dura, e mesmo, a admissão de mulheres ao bando.
Enfim, Lampião construíra em Sergipe um sólido “modelo de negócio” que lhe deu a oportunidade de desfrutar momentos de tranquilidade como nunca dantes. Depoimentos de pessoas da época dão conta de visitas a cidades, como Propriá e Laranjeiras, em busca de tratamento médico, por exemplo. Além de incursões como a de Capela, onde Lampião chegara a assistir ao filme “Anjo da rua” (Street angel), estrelado por Janet Gaynor.
O fato é que a região era, no geral, um bom coito para Lampião e seu bando, como vimos acima. Mas não apenas isso. Em um dos locais de pouso estabelecido na região catingueira do nosso Estado, Lampião estabeleceu uma espécie de quartel, onde podia reunir-se e tratar de outros assuntos diferentes da rotina de lutas.
Trata-se da Pia das Panelas, no atual município de Poço Redondo. Escondido por grandes propriedades, o citado coito era tão bem localizado no que tange à segurança, que os relatos dão conta de que nunca houve ataque por partes das volantes ao referido local.
Diante dos fatos é possível inferir que em um local seguro deste, não era incomum a presença de coiteiros responsáveis pelo fornecimento de víveres e demais produtos. Em conversas com Manoel Belarmino, morador da região e pesquisador independente, consideramos a possibilidade, de devido à segurança do coito, os cangaceiros receberem visitantes, acompanhados de crianças, ao menos em companhia de coiteiros.
O nome “pia” não era fantasia, consistindo em uma espécie de lajedo de pedra, seus buracos eram capazes de armazenar água por muito mais tempo que os riachos que secam logo após o inverno. No caso da Pia das Panelas, existem vários buracos onde se armazena água, tanto que os moradores da região, hoje, enchem os buracos de pedras, como forma de prevenção a acidentes com animais que ainda buscam o refúgio para a sede naquele antigo coito.
Além disso, o local consiste também em uma pequena elevação que somada às características da vegetação mais baixa, fornecia vantagem estratégica aos que ali repousam.
Alguns acontecimentos convergem para a ideia de que ali se tratavam assuntos de ordem “administrativa” do bando. Nesse sentido, exemplo maior é a morte de Lídia – dizem ter sido a mais bela – companheira do cangaceiro Zé Baiano – ao que se sabe, no mesmo dia da morte do Padre Cícero.
Após ter sido delatada pelo cangaceiro Coqueiro, que a teria visto deitar com o cangaceiro Bem Te Vi, Lídia fora arrastada para o famoso umbuzeiro que, ainda existe, no entorno do lajedo, onde esperaria amarrada pela morte a pauladas na manhã seguinte.
"Coqueiro", não se salvaria vivo, pois a delação era uma forma de traição, mesmo aquela, tão específica. Bem Te Vi, o conquistador, este salvou-se da morte, seja por proteção ou por haver fugido assim que soube do intento de Coqueiro – pois há quem defenda as duas versões.
Existe alguma divergência sobre como se deram os fatos com o conquistador, mas seja como foi, sabe-se que em algum momento ele fugiu, livrando-se de qualquer ato de violência física. O conquistador não sofreu nada.
Mas não foi somente esse assunto que terminou em morte naquele local: ali ainda morreram outras pessoas sob o manto das decisões gerenciais do cangaço. Uma, foi Rosinha, que após a morte do cangaceiro Mariano, viúva, declarou querer sair do cangaço e, a mando de Lampião, foi resgatada da casa dos pais e morta próximo ao Riacho do Quatarvo - imediações do coito.
Outro foi o sertanejo Zé Vaqueiro, que encontrou o cangaceiro Novo Tempo, que se arrastara ferido até a Fazenda Paus Pretos (de propriedade do Coronel Antônio Caixeiro, pai do Interventor Eronides de Carvalho, local onde fica a Pia das Panelas).
Sabendo do tiroteio que acontecera dias antes, o vaqueiro decidiu executar o cangaceiro, que conhecia muito bem, para ficar com os seus bens, afinal, o fogo da lajinha ocorreu em local diverso ao da Pia das Panelas, onde estavam eles, naquele momento.
O plano do vaqueiro deu errado, o cangaceiro não somente sobreviveu ao disparo feito por Zé Vaqueiro, como conseguiu fugir. Dias depois, Novo Tempo já recuperado e com o bando, pegaram Zé Vaqueiro e o executaram às margens do riacho, queimado, após o seviciarem até sua exaustão.
Outra morte registrada no local, foi a de Preta de Maria das Virgens, que teve a cabeça esmagada pelo namorado Zé Paulo, que não queria assumir a responsabilidade da gravidez da moça.
Os cinco casos relatados têm a traição em diversas perspectivas como ponto comum. Coqueiro, Lídia e Zé Vaqueiro morrem porque traem. Rosinha morre pelo medo que a sua “deserção” causa, dada a possibilidade de traição que rondaria sua reintegração à vida normal, sendo ela conhecedora de coitos e coiteiros. E Preta de Maria das Virgens morre à traição, esta encetada pelo próprio namorado, pai do filho que esperava em seu ventre.
É característica da traição marcar a terra com sangue.
Sobre cemitérios, conta-se que o local que circunda a Pia das Panelas era antes um Campo Santo/Cemitério indígena. O local sob o Umbuzeiro onde supõe-se estar enterrado o corpo de Lídia de Zé Baiano é recoberto por pedras, que lhe facilitam identificá-lo e o fizeram famoso.
Mas sob um olhar mais atento, é possível observar que existem ainda muitas formações de pedras que sugerem ser demarcadoras de local de enterramentos humanos. É fato que, o local já foi remexido para exploração agrícola e, certamente, muitos vestígios arqueológicos já se perderam.
Por outro lado, certamente por questões culturais, alguns espaços como o entorno próximo da Pia e o umbuzeiro com o pretenso túmulo de Lídia ainda resistem.
EPÍLOGO
Ao visitarmos locais como esse, de sofrimento e dor – que representam histórias com muito sangue, ao menos para quem crê em vida além da vida – devemos considerar o peso que esses eventos carregam, nesses lugares, de energias ligadas as emoções de quem viveu tais situações. Se não quisermos pensar em energias (se está cético, se pergunte sobre o que se capta do corpo humano em um eletroencefalograma, por exemplo) pensemos no seguinte: quem gosta de reviver momentos ruins? Ou de ouvir pessoas recontando nossas péssimas experiências?
Longe de querer limitar ou ser contra as visitações aos sítios históricos, mas sim deixar aqui uma reflexão sobre como nos portamos nesses locais e como, respeitosamente, devemos nos portar neles.
Por fim, o local da Pia das Panelas, além de um sítio de interesse histórico, possivelmente, também se trata de um sítio de interesse arqueológico – cemitério indígena, a despeito de já haver sido bem modificado pela ação da atividade agropecuária nas últimas As décadas. Muitas das pedras, se foram usadas para demarcar sepultamentos, hoje certamente já estão fora do seu local de origem.
Mas ainda há um pequeno espaço central – exatamente onde fica o lajedo da Pia das Panelas – preservado, inclusive em seu entorno próximo, assim como o umbuzeiro onde se supõe estar Lídia enterrada, onde encontramos um pequeno ajuntamento de pedras, em padrão que vemos em covas rasas.
Agora é a vez do IPHAN.
* É tenente coronel da PM/SE e membro da Academia Brasileira de Letras e Artes do cangaço. (eduardomarcelosilvarocha@yahoo.com.br)
sábado, 28 de outubro de 2023
O cangaço...
E os mensageiros
Por Luis Bento
Lampião foi capaz de arregimentar uma legião de colaboradores, uma malha informantes e mensageiros, numa época em que a telefonia ainda engatinhava no Brasil, principalmente no nordeste. Assim construiu uma rede de comunicação tão grande que nenhum outro homem da região foi capaz.
No então distrito Macapá atual Jati-CE, morava Joaquim Aureliano Pereira da Silva, "Quinca Pereira" irmão do cangaceiro Sebastião Pereira da Silva, senhor Pereira. No ano de 1919, ele foi procurado pelo padre Cícero Romão Batista a levar uma carta ao irmão. A carta constava o seguinte teor. " Era um pedido ou uma ordem, que o cangaceiro suspendesse as armas, abandonasse as questões entre as famílias: Pereira, Carvalho e fosse se refugiar-se em terras distantes ".
Quinca Pereira |
Manoel Cunha Moura, Neco Cunha, outro mensageiro do distrito Macapá atual Jati-CE. No dia 2 de março do ano ano de 1926, Lampião passará pelo então distrito com destino a cidade de Juazeiro do padre Cícero. Neco Cunha, pediu a Lampião que a sair do distrito passasse em sua residência, tinha uma correspondência a lhe entregar, uma uma carta de seu ex-chefe Senhor Pereira que já se encontrava refugiado no estado de Goiás.
A carta tinha o seguinte teor. "era uma carta convite, convidando Lampião a abandonar as armas e se refugiar-se em Goiás ".
Neco Cunha |
O mensageiro, foi de suma importância na historiografia do cangaço, Lampião tinha muito respeito por todos, além das correspondências ser preservadas no mais absoluto segredo, ainda contava com excelentes redes de informações.
*Luís Bento é Diretor de Cultura.
A Noite " edição de 14 de Dezembro de 1932
Informes confusos sobre as mortes de alguns cangaceiros
Por Helton Araújo- Cangaço Eterno
Na matéria do jornal " A Noite " edição de 14
de Dezembro de 1932 ", o periódico traz o seguinte título : " O
BANDITISMO NO NORDESTE ", com o subtítulo " A campanha vae ser feita por
mais de tres mil soldados - " Antônio de Engracia " morreu mesmo, e foi
comido pelos corvos (seguindo a escrita da época).
Apesar da
péssima resolução da matéria, vou passar para vocês um resumo da
publicação e fazer algumas observações em seus principais tópicos.
A
matéria tem início informando que a campanha contra o banditismo está
na região tranquilizando a população que vem sofrendo com as incursões
de Lampião e seu bando nas regiões do sertão baiano e sergipano.
O
periódico informa que há poucos dias a volante comandada pelo tenente
Justiniano travou ríspido combate contra o bando de Lampião, nas
proximidades de Juá, em Santo Antônio da Glória, nessa ocasião foi
morto o cangaceiro Baliza e presa a sua companheira. Aqui fazemos nossa
primeira observação, o periódico não informa o que a tradição oral diz
sobre a história de Baliza, que o mesmo teria sido surpreendido por
Justiniano e seus homens, no momento em que estava em relações sexuais
com sua companheira.
A Tradição oral ainda diz que o tenente
Santinho ( Ladislau Reis ) quando se encontrou com a volante do " cabo "
Justiniano ( o jornal diz tenente ) solicitou ao mesmo por ter a
patente maior a condução e recambiamento do cangaceiro. Daí popularmente
sabemos o que aconteceu com Baliza, que foi torturado e morto em uma
fogueira por Santinho e seus homens.
Fica claro que o periódico
não apresenta essas informações, destaco ainda, que na tradição oral a
data do acontecimento seria março de 1933, mas o jornal relata que o
fato se deu em dezembro de 1932, ficando aí a inconsistência.
Cabe
aos pesquisadores buscarem mais informações se de fato Santinho
torturou e matou Baliza ou se essa história é mais uma entre tantas
outras que caiu nos contos e folclores populares sobre o cangaço.
A
matéria segue com mais uma excelente informação, segundo o jornal, as
colunas volantes descobriram que de fato o cangaceiro Antônio de
Engrácia estava morto, cujo acontecimento deixava dúvidas sobre a
veracidade da morte do cangaceiro.
Um coiteiro de Chorrochó
preso, disse que Antônio foi gravemente ferido pelo contratado
Hermógenes, sobrinho do fazendeiro sergipano José Ribeiro. Segundo o
coiteiro, Antônio veio a falecer em decorrência de seus ferimentos em
sua própria residência, ainda segundo o coiteiro, seu corpo ficou
insepulto, vindo a ser devorado pelos "corvos".
Ele prossegue
informando que as ossadas do cangaceiro foram levadas até Jeremoabo (
não informando quem a levou ), onde ficou em exposição. Aqui faço mais uma
observação, o jornal fala de Antônio de Engrácia, porém segundo as
informações que temos nas pesquisas do cangaço, quem teria sido morto
por Hermógenes, seria o cangaceiro "Antônio de Seu Naro", sendo assim,
acredito eu, que houve apenas uma confusão de informações, pois Antônio
de Seu Naro também era um Engrácia e também lhe caberia a apresentação
como Antônio de Engrácia.
Diante dos fatos, creio eu que a
matéria refere-se ao cangaceiro Antônio de Seu Naro e não de seu parente
Antônio de Engrácia. Nos tempos atuais, aqueles que fazem pesquisas, se
não cruzarem as informações podem fazer uma grande confusão histórica
entre os fatos acontecidos e seus personagens.
Gostaria de
associar essa informação das ossadas levadas para Jeremoabo com aquela
matéria que também roda por aí, dos ossos e crânios dos cangaceiros "
Antônio de Engrácia " e Ponto Fino (Ezequiel Ferreira), diante dessa
matéria, acredito que aquelas ossadas sejam de fato Antônio de Seu Naro e
do suposto Ponto Fino.
A matéria traz mais algumas ótimas
informações, a primeira é que o sertão baiano contará com o reforço de
mais de 3 mil soldados na campanha contra o banditismo.
A
segunda, o Capitão João Miguel conseguiu auxílio mensal de 20 contos de
réis para ajudar os flagelados da seca. Além de mandar construir
estradas de rodagem por vários locais da região.
Vale lembrar que
isso contradiz o que a tradição oral conta sobre a ação do capitão João
Miguel, o mesmo teria mandado os sertanejos abandonarem suas casas em
uma tática irresponsável na tentativa de dificultar as ações dos
cangaceiros na região, Isso não só favoreceu os cangaceiros como causou
mais sofrimento para os pobres sertanejos, esse fato relatado ficou
conhecido como " A seca de João Miguel "
E para finalizar, a
matéria relata que foi aprendido na casa de um coiteiro a metralhadora
que Lampião conseguiu no confronto no Tanque do Touro (onde
supostamente teria morrido Ezequiel Ferreira) contra a volante
comandadas pelo tenente Arsênio Alves, além de outros armamentos e
muitas munições.
Encerro esse texto sem querer desmerecer o
trabalho de nenhum dos companheiros de pesquisa, pelo contrário,
reafirmo aqui meu respeito a cada um, meu intuito com essa postagem é
apenas elevar a história ao mais próximo possível da realidade. Deixo
claro também, que não sou dono da verdade e que posso estar errado em
minhas observações, mas fica aí o material para confrontação de
informações e esclarecimentos e dúvidas.
quinta-feira, 26 de outubro de 2023
101 anos depois
Processo de 1922 revela tocaia de Lampião para matar delator de seu pai
Por Carlos Madeiro Portal UOL
Eram por volta das 19h do dia 14 de agosto de 1922, quando Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, dois irmãos e mais um grupo de cangaceiros foram até Água Branca, no sertão alagoano, fazer uma tocaia e cumprir uma missão que juraram a si mesmos.
Eles esperavam a passagem de um homem: Manoel Cipriano de Souza, que foi morto com três tiros, um dado por cada um dos irmãos Ferreira.
Revelação importante
Segundo Lampião, foi ele quem delatou o local onde estava seu pai, José Ferreira dos Santos, no dia 18 de maio de 1921. Nessa data, ele foi morto pelo tenente José Lucena de Albuquerque Maranhão, em Mata Grande, sertão de Alagoas.
A morte do pai de Lampião é um episódio marcante para o cangaço. A história conta que os irmãos Ferreira resolveram entrar na vida do crime para vingar os ataques que o pai sofria de um vizinho — que virou inimigo — chamado Zé Saturnino. A morte do pai foi o estopim para eles entrarem no cangaço.
Justiça acha processo
O processo judicial que denunciou Lampião e mais quatro cangaceiros pelo crime estava guardado no Fórum de Maceió. Ele traz detalhes que eram desconhecidos do crime.
O documento foi encontrado recentemente, junto com outros processos, pelo juiz e historiador Claudemiro Avelino. Todas são denúncias que acusam Lampião ou cangaceiros do seu bando por crimes de mortes, roubos e estupros.
No assassinato do suposto delator Cipriano foram denunciadas cinco pessoas
- Lampião
- Livino Ferreira, irmão de Lampião
- Antônio Ferreira, conhecido como Esperança e também irmão de Lampião
- Antônio Rozendo, conhecido como Antônio Gelo
- Antônio Bagaço (abaixo)
Antônio Augusto (Feitosa ou Correia), Antonio Bagaço |
Em depoimento à polícia, a testemunha Manoel Pedro de Alcântara narrou tudo que houve naquela noite. Diz que ele e Manoel Cipriano estavam cruzando a cancela do Mané, vindos da feira de Água Branca, quando homens armados com rifles o abordaram.
Lampião mandou eles descerem dos cavalos e perguntou o nome deles. Cipriano, o primeiro a responder, recebeu logo uma resposta do chefe: "É esse mesmo que estamos esperando."
Ao reconhecer seu alvo, ele mandou que a testemunha se afastasse e não saísse até ele dar uma "ordem expressa."
Cipriano foi então arrastado para um local ao lado do cavalo em que estava, quando Lampião perguntou sobre o dinheiro que ele levava. Ele tinha apenas 10 mil contos de reis, pouco para a época.
Tortura e morte
Outra testemunha do crime, Silvino Antônio dos Santos afirmou à polícia que Cipriano ainda perguntou o que Lampião queria, e disse que "ele daria para salvar a vida."
A frase dita por Cipriano, segundo testemunhas que depuseram, foi:
"Lampião, não me mate. Deixe eu criar minha família", clamou Manoel Cipriano.
Não adiantou. Lampião ainda "judiou" de Cipriano (não há detalhes de como) e o sentenciou em seguida.
"Agora você conhece Lampião. Foi você quem indicou onde meu pai estava para o matarem. Agora você é quem vai pagar.
Lampião então se afasta para trás e dá o primeiro tiro. Os dois irmãos de Lampião que o acompanhavam deram mais dois em seguida.
Foram três tiros; no segundo tiro ele caiu por terra.
Manoel Pedro de Alcântara, testemunha.
Processo está guardado no Fórum de Maceió. |
Após os tiros, e vendo a vítima no chão, um do cangaceiros disse: "Basta, vamos embora." Foi quando outros integrantes do bando saíram do meio do mato, onde estavam na espreita para dar segurança aos irmãos Ferreira. Na fuga, um dos cangaceiros montou e levou o cavalo da vítima.
A morte não foi a única vingança dos irmãos. Após matarem, eles foram até a casa onde morava Cipriano. Ao chegarem, um filho da vítima perguntou aos cangaceiros o que eles queriam e o que tinham sido os tiros na cancela. Lampião então respondeu: "Vá lá examinar."
As testemunhas narram que eles em seguida empurraram o filho e entraram na casa, onde quebraram portas, baús, celas, móveis e roubaram "tudo que puderam". Logo depois, fugiram em cavalos.
Lampião e mais quatro denunciados
A promotoria pública de Alagoas, após os depoimentos, denunciou Lampião e outros quatro cangaceiros identificados pelas testemunhas no dia 9 de outubro de 1922. Cinco dias depois, o juiz da comarca de Água Branca acolheu e pronunciou (mandou a julgamento) os réus.
Parte dos autos em que a promotoria denuncia Lampião |
Só que o processo nunca andou, e ninguém foi julgado.
Foram dadas várias ordens de intimação dos réus, mas sempre falavam que não os achavam, ou creio que não iam atrás para notificar. Naturalmente, todos tinham medo de Lampião
Claudemiro Avelino, historiador e juiz
Nenhum dos cangaceiros foi levado a julgamento em nenhuma das denúncias encontradas até aqui em Alagoas.
Em 1939, um ano após Lampião ser morto na grota do Angico, em Sergipe, um dos processos foi declarado extinto. "Nós demais processos não achamos isso essa extinção, mas talvez tenha havido uma ordem para que todos fossem arquivados, mas não encontramos", diz.
Esse e os outros processos achados fazem parte da pesquisa de Claudemiro, que vai render um livro sobre o cangaço. A obra está em fase final de seleção de imagens para publicação…
Todos também serão digitalizados aos poucos e colocados para acesso público.
Esses documentos são essenciais, porque sobre o cangaço há muita fantasia e folclore. O processo é um documento primário, original. Ele serve para espantar todas as dúvidas.
Juiz Claudemiro no acervo histórico do TJ de Alagoas. |
Historiador, ele fez um curso de restauração de documentos antigos e passou a analisar cada um deles. O conhecimento sobre o tema o levou a ser chamado para ajudar na montagem do Museu do STF.
Também foi ele responsável pelo museu no TJ (Tribunal de Justiça) de Alagoas.Em Alagoas, diz, será montado um laboratório de restauração de documentos históricos.
quarta-feira, 25 de outubro de 2023
Pias das Panelas
Um dos cenários mais tristes da saga lampiônica
Texto e fotos Kiko Monteiro
terça-feira, 10 de outubro de 2023
Lampião no Rio Grande do Norte
A história do esconderijo da Caverna da Carrapateira
Rostand Medeiros – IHGRN
A zona rural do município de Felipe Guerra impressiona tanto os espeleólogos como os habitantes locais. No tocante a quantidade e a qualidade das cavernas. Há tempos que esse município se mostra como uma das mais promissoras áreas no estado do Rio Grande do Norte e com ótimas possibilidades para o desenvolvimento do turismo espeleológico.
Mas além do seu conjunto de belas cavidades naturais, a região de Felipe Guerra mantém, mesmo passados quase 95 anos, as memórias e as lembranças das agruras sofridas com a passagem do bando do cangaceiro Lampião, em seu ataque a cidade de Mossoró.
Dessas lembranças ficou o registro do medo e as mudanças que os mais antigos sofreram em suas vidas, com os acontecimentos ocorridos em junho de 1927. Uma época em que o trabuco falava mais alto que a força da justiça. Até hoje a tradição oral é transmitida dos que ouviram dos seus familiares, trazendo para os mais jovens os acontecimentos de um momento triste da história do sertão potiguar e o interessante em Felipe Guerra é que muitos possuem uma ou mais história sobre esses acontecimentos.
E a maioria da sua população sabe da existência destas cavernas através dos acontecimentos da época do cangaço, pois foi em uma destas cavidades que alguns habitantes conseguiram um abrigo prático para os terríveis eventos que ocorriam nas proximidades das suas casas e deixou na lembrança das pessoas do lugar um respeito muito grande por este tipo de ambientes natural.
Esta é a história daqueles dias incertos e da caverna que ajudou os moradores do lugar.
A Pedra de Abelha
Em 1927 Felipe Guerra era um pequeno arruado conhecido como Pedra de Abelha, fincado às margens do Rio Apodi, onde a vida seguia tranquila, para seus pouco menos de 1.000 habitantes. Eles sobreviviam da cera de carnaúba, da pequena agricultura e da pecuária. Na época dos invernos mais fortes, a pequena vila sofria as enchentes provocadas pelo Rio Apodi, como foi o caso das cheias de 1912, 1917 e a de 1924.
Por esta época Pedra de Abelha era um ponto de passagem de viajantes, tropas de burros, vendedores, vaqueiros e outros andarilhos que seguiam a estrada entre a pulsante e rica cidade de Mossoró e a progressista Apodi.
Havia uma pequena feira que crescia a cada ano, sempre em ordem e em paz, pronunciando uma tendência de progresso para o pequeno lugar. Outra lembrança de boas perspectivas foi a passagem de alguns homens, de língua enrolada, que se diziam engenheiros, faziam medições e coletavam pedras no lajedo do Rosário, na região da Passagem Funda, um lugarejo a oito quilômetros de Pedra de Abelha. Logo se espalhou a notícia que o lugar seria transformado em uma grande barragem, que haveria muitos empregos, que seria maior que a barragem de Pau dos Ferros e que a vida em Pedra de Abelha iria mudar para melhor. Mas a barragem não veio e a vida seguiu tranquila.
Junto com os primeiros dias de maio de 1927 chegaram notícias de que a região oeste do estado do Rio Grande do Norte iria conhecer e sofrer.
No dia 10, pela madrugada, o cangaceiro paraibano Massilon Leite e mais vinte bandidos atacaram Apodi, depois seguiram para Gavião (atual Umarizal) e na sequência, pilharam a pequena vila de Itaú. Os relatos comentavam que apenas um cangaceiro foi preso próximo à cidade serrana de Martins.
Para a ordeira população de Pedra de Abelha, ficou o pensamento de que, se os cangaceiros haviam atacado Itaú, uma vila praticamente do mesmo tamanho do seu lugar, por que não atacariam o pequeno povoado à beira do Rio Apodi?
Passou então a existir no seio da população uma forte intranquilidade.
Não que os moradores de Pedra de Abelha não soubessem o que era violência. Já haviam ocorrido casos de criminosos assaltando viajantes, pistoleiros contratados por coronéis para impor suas ordens, a realização de tocaias e o flagelo da vingança. Um dever sagrado entre os sertanejos. Um dever que filhos de qualquer pai assassinado herdaram. E seria vergonhoso, seria desonra inominável em uma família enlutada pelo homicídio, se não aparecesse um vingador um “cabra macho” para cumprir a sina.
Realmente violência não era novidade naquele recanto perdido do sertão, mas um grande grupo de cangaceiros era um problema novo por aqueles lados.
No Cangaço
Os nomes de cangaceiros antigos como Lucas da Feira e Jesuíno Brilhante, e de facínoras mais novos (para 1927) como Antônio Silvino, Sinhô Pereira e Luís Padre, eram muito comentados pelos habitantes mais idosos e pelos viajantes que procediam da Paraíba, Ceará e Pernambuco. Mas nos últimos tempos o nome mais comentado, temido e respeitado era o do famoso Lampião.
O Pernambucano natural de Vila Bela, atual Serra Talhada, com pouco menos de 30 anos em 1927, já era uma lenda e o seu nome impunha respeito e terror em grande parte do Nordeste.
Nascido em 4 de junho de 1898, Virgulino Ferreira da Silva vinha de uma família humilde, mais proprietária de uma pequena fazenda. Seu pai, José Ferreira, trabalhava como condutor de tropas de burros que transportavam mercadorias pelos sertões de Pernambuco e Alagoas. Nessas viagens, Virgulino e seus irmãos passaram a conhecer aqueles caminhos e mantiveram contatos que seriam preciosos no futuro.
Em 1915, inicia-se um problema com o vizinho José Saturnino, envolvendo o desaparecimento de animais de criação. Estas desavenças dariam início à metamorfose de Virgulino em Lampião.
Devido a perseguições, em um prazo de três anos, a família Ferreira vê-se na contingência de realizar várias mudanças, sendo obrigados a vender as suas terras e a viver como empregados pelas pressões sofridas. Devido aos fatos, a mãe de Virgulino acabou falecendo, aparentemente de um ataque cardíaco. Já seu pai foi assassinado por uma tropa da polícia alagoana que perseguia os irmãos Ferreira.
É impossível não observar que uma das razões da entrada dos irmãos Ferreira no cangaço, foi à falta de justiça pelas contínuas perseguições sofridas, criando uma reação armada que abalou o Nordeste do Brasil ao longo de vinte anos.
No início, a atuação de Lampião foi em outros bandos, finalmente assumiu o comando de seus “cabras” em 1922, nesse mesmo ano assaltaram o casarão da Baronesa de Água Branca, em Alagoas, fazendo aumentar a sua terrível fama. Em 1924, seus cangaceiros, em conjunto com o paraibano Francisco Pereira Dantas, o conhecido Chico Pereira, atacam a progressista cidade de Sousa, no oeste da Paraíba. Em 25 de maio de 1925 Lampião e seu bando
Lampião era um guerrilheiro nato, produto de um meio quase selvagem e atrasado. Possuía a capacidade de articular ataques, fugas mirabolantes, alianças escusas e uma perícia na manivela e no gatilho do rifle que parecia “alumiar” à noite, daí o seu famoso apelido.
Em 1926 uma coluna de homens que percorriam o país com a intenção de derrubar o governo do presidente Arthur Bernardes, comandados por Miguel Costa e Luís Carlos Prestes, se aproximou e entrou em território cearense, Para fazer frente a essa situação foi criada uma frente de defesa contra os chamados Revoltosos na cidade de Juazeiro do Norte, onde o principal líder político e religioso do lugar, o Padre Cícero, mandou convocar o chefe cangaceiro que aterrorizava o sertão nordestino para combater aquele grupo, que entraria para a História do Brasil conhecido como Coluna Prestes.
No dia 5 de março, Lampião, à frente de 50 cangaceiros, entra em Juazeiro. Ele se encontra com o Padre Cícero, recebe uniformes, armamentos modernos e a sua propalada patente de capitão dos Batalhões Patrióticos. Ao sair de Juazeiro e seguir para Pernambuco, Lampião é perseguido pela polícia local. Desapontado, aparentemente decide voltar para Juazeiro para falar com o Padre Cícero, mas este não o recebe e Lampião encerra a sua breve carreira de defensor público.
Passagem dos Cangaceiros
Voltando à pacata Pedra de Abelha na metade de 1927.
Os habitantes do singelo lugar ficaram bem apavorados quando chega a notícia que em 10 de junho, incentivado por Massilon Leite, Lampião cruzou a fronteira da Paraíba e entrou no estado Potiguar com cerca de 60 cangaceiros (número que gera muita polêmica até hoje) montados em cavalos e burros, todos seguindo em direção a Mossoró.
Avançando para o norte, promoveram um verdadeiro bacanal de destruição, rapinagem e terror. Roubaram, tocaram fogo em diversas fazendas, assassinaram os que reagiam, entraram em confronto com a polícia e fizeram alguns prisioneiros, do qual só libertaram mediante resgate. Lampião e seus cangaceiros realizam os primeiros sequestros conhecidos no Rio Grande do Norte. A passagem de Lampião e seu bando durou apenas cinco dias, mas a região oeste potiguar nunca esqueceu este episódio.
O bando passou ao lado da povoação de Gavião (atual Umarizal) e continuou depredando as propriedades como Campos, Arção, Xique-Xique e Apanha Peixe e nesta última propriedade, para a sorte da população de Pedra de Abelha, o bando foi dividido.
Às sete da noite de 12 de junho de 1927 seguiu o cangaceiro Massilon Leite para assaltar pela segunda vez a cidade de Apodi, enquanto Lampião seguia para Mossoró. Em Apodi houve resistência da população, obrigando Massilon a fugir. Devido a esta divisão, Lampião seguiu adiante por outra estrada, passando paralelo ao povoado de Pedra de Abelha. Realmente foi por pouco que a pequena comunidade não foi invadida.
Mas se não foi invadida, esse caminho fez o bando cruzar com o comerciante e fazendeiro Antônio Gurgel do Amaral, proprietário de uma moderna fazenda em Pedra de Abelha, às margens do Rio Apodi, no atual Distrito do Brejo. Nesta propriedade foram empregadas muitas pessoas.
Até recentemente o local possuía uma estrutura muito moderna para a época, inclusive com eletricidade e mecanização. Antônio Gurgel havia acabado de chegar de uma viagem da Europa, onde buscava trazer matrizes de novas raças bovinas para desenvolverem-se na sua região.
Assim que soube do avanço dos cangaceiros, seguiu de Mossoró para a sua fazenda e proteger seus familiares e seus bens. No meio do caminho, na localidade chamada Santana, foi preso por membros do bando. Era o dia 12 de junho e somente no dia 25, Gurgel seria libertado no Ceará, juntamente com outra refém. Por ser Gurgel um homem inteligente, de boa conversa, índole calma e que sempre procurou a tranquilidade junto aos bandidos, ele nada sofreu.
Durante sua convivência forçada, escreveu um diário que é tido como o mais completo documento sobre a vida e o dia a dia entre estes cangaceiros. Lampião lhe deu duas moedas de ouro para serem presenteadas a sua neta e, como pagamento de uma promessa feita pela sua liberdade, sua mulher construiu uma capela na Fazenda Santana, que infelizmente foi demolida, bem como a sede de sua fazenda em Felipe Guerra.
A Caverna da Carrapateira
Antes até da prisão do coronel Gurgel, com a chegada das notícias cada vez mais assustadoras, a população de Pedra de Abelha tratou de procurar refúgio onde houvesse condições. Muitos seguiram para a fronteira do Ceará, outros foram para propriedades de parentes mais distantes e outros que conheciam melhor a região, buscaram o abrigo das cavernas.
É bem verdade que a população do sertão possui um medo respeitoso em relação às cavernas, mais naquele momento, este medo foi deixado de lado e a escuridão da caverna passou a ser um abrigo mais acolhedor do que a incerteza da luz do dia e a presença de cangaceiros na região.
A caverna da Carrapateira fica localizada no Lajedo do Rosário, próximo ao atual distrito de Passagem Funda e a pouco mais de mil metros da margem esquerda do Rio Apodi. Entre as várias cavernas deste lajedo, essa é a que apresenta a maior facilidade de penetração.
Sua entrada tem formato oval, com quatro metros de altura e possui desenvolvimento horizontal, no seu início encontram-se alguns blocos caídos e deslocados, também presentes localmente no interior da caverna.
Chama a atenção a forma como a natureza moldou o túnel principal, sendo muito largo e alto para os padrões das cavernas nas proximidades. Sua sinuosidade apresenta contornos de fluxo d’água, marcados nas paredes bastante lisas, lavradas, de rocha calcária limpa e de cor amarelada, com níveis de sedimentação à mostra. Os espeleotemas, as famosas formações rochosas que ocorrem tipicamente no interior de cavernas como resultado da sedimentação e cristalização de minerais dissolvidos na água, criando muitas vezes materiais de rara beleza, são encontrados nessa cavidade. São escorrimentos de calcita, cortinas, algumas estalactites e estalagmites. Na parte posterior do corredor principal, aparecem outros tipos de espeleotema muito comum nas cavidades da região: o couve-flor.
Conforme adentramos a caverna da Carrapateira, o chão vai apresentando uma menor continuidade, mostrando reentrâncias, blocos rolados, até desembocar em uma bifurcação, de onde a caverna segue para salões mais apertados, seguindo por condutos menores. Neste setor, tem-se uma clarabóia de poucos metros de altura, aproximadamente três metros. Por ela pode-se sair do interior com facilidade.
Pelas dimensões do seu interior, pela proximidade com o rio e como na região encontram-se diversas provas da passagem de grupos de caçadores e de coletores, entre 5.000 e 2.000 anos atrás, essa caverna é a que melhor poderia sugerir a possibilidade de algum indício arqueológico. Contudo, não foram vistos pinturas ou evidências nesse sentido. Sua litologia é o calcário e até anos recentes não apresenta nenhuma depredação.
Durante nossas visitas à caverna da Carrapateira não foram encontrados vestígios da ocupação dos habitantes de Pedra de Abelha na caverna.
Quando das nossas visitas à região, ouvimos repetidas vezes relatos de pessoas cujos avós e outros familiares buscaram abrigo nesse local. Entretanto o tempo, o Senhor de tudo e de todos, chegou à nossa frente, pois aqueles que buscaram esse local como abrigo já não estavam mais nesse plano. Mas percebi que o número de pessoas que buscaram esse abrigo foi pequeno. Além disso, foi possível observar que, diferentemente de outras pessoas que guardam na memória relatos daqueles que tiveram experiências com cangaceiros na região, os poucos parentes daqueles que buscaram abrigo na caverna da Carrapateira, pouco tem a comentar.
Como, para a sorte dos refugiados escondidos na caverna da Carrapateira, não houve nenhum tipo de contato com os cangaceiros e quase certamente os que buscaram esse abrigo em 1927 foram poucos, ao longo do tempo esse tema caiu no esquecimento. Pois no final das contas, sobreviver naquela região é parte da rotina diária.
Fim Do Ato
Lampião seguiu seu caminho.
Na Segunda-feira, 13 de junho de 1927, dia de São Francisco, às 16:30 da tarde, com o céu nublado, os cangaceiros, divididos em três colunas, atacaram a maior cidade do interior do Rio Grande do Norte. O seu Prefeito, Rodolfo Fernandes, sem ajuda do governo do estado, conseguiu reunir desde advogados, dentistas, comerciantes, padres e pessoas comuns, entrincheirando-os em vários locais.
Os cangaceiros foram derrotados depois de uma hora de combate, não mataram ninguém e perderam um cangaceiro na hora e outro, o temível Jararaca, foi ferido e capturado no outro dia. Acabou assassinado pela polícia local no dia 20 de junho e o mais incrível é que seu túmulo se tornou um local de peregrinação religiosa popular.
Lampião sofreu a sua mais terrível derrota, comentou que “Cidade com mais de quatro torres de igreja não é para cangaceiro”. Sem conhecer o seu tamanho e a sua capacidade de defesa, acabou enganado pela promessa de Massilon de pouca resistência e muito dinheiro.
O seu ataque a Mossoró causou repercussão em todo país, sendo noticiado em muitos jornais. Foi um verdadeiro choque, que impulsionou ainda mais a sua fama. Foi a partir deste episódio que o seu nome ficou muito conhecido no sul do país.
Após fugir do Rio Grande do Norte, para onde nunca mais voltou, o bando seguiu para o Ceará, onde pensavam que estariam protegidos e foram implacavelmente perseguidos. O mesmo ocorreu na Paraíba e em Pernambuco. Em 1928 cruzou o Rio São Francisco e conseguiu uma sobrevida de mais dez anos, praticando atrocidades na Bahia, Alagoas e Sergipe, onde foi morto, com a sua companheira Maria Bonita, na Grota do Angico.
Para a população de Pedra de Abelha, sempre que as notícias sobre Lampião surgiam, voltava as lembranças dos medos e aflições de junho de 1927. Com a sua morte (1938) e o desbaratamento do cangaço (1940), passa a existir um alívio. Com o passar dos anos, ocorre o natural desaparecimento das vítimas sobreviventes dos atos cruéis dos cangaceiros e muitos dos descendentes destas vítimas deixam a região, emigrando para grandes centros. Falar sobre os fatos da época do cangaço deixou de ser um tabu.
A partir dos anos 1960, o mito deste cangaceiro o torna um dos personagens históricos mais famosos da cultura popular brasileira, onde em muitos lugares do país a figura de Lampião é encarada como símbolo de nacionalidade e o Cangaço como um expoente da luta da cultura e do povo nordestino.
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