quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Armas de fogo

 As 'Bergmann' de Angico

Por A. Fábio Carvalho Costa*

Caros amigos, em homenagem aos 80 anos da morte de Lampião e Maria Bonita, escrevi este texto especialmente para o blog do amigo Kiko, sobre as armas automáticas usadas pela polícia em Angico, espero que apreciem.

Os governos estaduais nordestinos buscavam a todo custo na década de 1930, a erradicação total dos bandos de cangaceiros. Para isso introduziram o conceito de tropas “volantes”, ou seja, tropas com grande mobilidade e sem circunscrição, que seguiam no encalço dos bandidos pelos sertões afora. Por vezes atravessando divisas estaduais com base em acordos celebrados pelos governos nordestinos.

O conhecimento do terreno, e do território, a adaptação às agruras e dificuldades da caatinga, davam aos bandoleiros óbvias vantagens táticas.

A vantagem do armamento policial composto pelos fuzis e mosquetões militares do tipo Mauser (geralmente os mod. 1908), no calibre 7 mm, inicialmente superior aos dos bandidos, foi suprimida em 1926 no afã de combater a coluna Prestes, com a cessão pelo governo federal de armas idênticas (e até mais modernas e cômodas de se usar, como os mosquetões FN 1922), o que se revelou uma estratégia no mínimo equivocada que talvez tenha dado sobrevida a Lampião por mais dez anos.

A solução encontrada foi prover os grupos com armas automáticas mais leves, complementares aos fuzis-metralhadores Hotchkiss 1922 ou Madsen 1918, para que a mobilidade da tropa não fosse comprometida, mas mantendo alguma superioridade de fogo. Principalmente em frações de tropas muito reduzidas.

As submetralhadoras Bergmann MP 28 II eram algumas destas armas automáticas.


 MP28

 MP35

Esta arma foi redesenhada por Hugo Schmeisser com base no modelo MP18.I, e tinham como modificações principais o alojamento do carregador, modificado para receber carregadores retos do tipo caixa, ao invés dos complicados e defeituosos carregadores tipo "caracol" da antecessora. E um seletor de fogo para o tiro intermitente ou automático, que era um pino transversal colocado acima do gatilho, e alça de mira tangencial graduada até mil metros.

O calibre era o 9 mm Parabellum, mas foram fabricadas também em 7,65 mm Parabellum, 7,63 mm Mauser, e talvez em .45 ACP.

As policias Nordestinas as usaram em calibre 7,63 mm Mauser, talvez devido à popularidade das pistolas Mauser C-96 “caixa de pau”.

A submetralhadora Bergmann MP 28 II era uma arma de construção robusta e bem feita, porém cara.

A Força Pública Pernambucana apreendeu em 1931 dos Irmãos Lundgren (além de muitas outras armas) 25 submetralhadoras de fabricação alemã com 71 pentes (SIC) e 23.472 cartuchos; 02 metralhadoras sem coronha. Estas armas pelo período, provavelmente eram estas Bergmann MP 28 II. Consta que foram usadas depois contra os cangaceiros.

A submetralhadora Bergmann MP 28 II foi copiada pelos ingleses durante a segunda guerra com o nome de Lanchester.

As policias Nordestinas ainda usaram submetralhadoras Bergmann MP 35.

O escritor Frederico Pernambucano de Mello cita no livro '”Guerreiros do Sol”, que uma Submetralhadora Bergmann MP34 também estaria presente no ataque a Grota de Angico. Mas uma análise da foto mostra que é uma modelo 1935 (as diferenças eram a longitude do cano, maior na MP34, e outros detalhes secundários).

 O então tenente Bezerra 
e a tropa que dizimou Lampião e parte do seu bando em Angico.

Esta é uma arma rara por aqui, e praticamente desconhecida do grande público. Aparentemente teve uso policial no Brasil somente no Nordeste.

A Submetralhadora Bergmann MP35 derivou-se de uma arma fabricada sob licença pela empresa dinamarquesa Shulz & Larsen, a BMP32, desenhada por Emil Bergmann (filho do célebre Theodor Bergmann, que desenhou a MP18). Esta arma tinha algumas características interessantes (o carregador é montado no lado direito da arma, com a janela de ejeção à esquerda, sendo o contrário mais usado em submetralhadoras. A alavanca de manejo do ferrolho é localizada na traseira da arma, sendo sua operação semelhante a do ferrolho do Fz. Mauser.

Para mover o ferrolho, gira-se para a posição vertical e puxa-se para trás. O gatilho é duplo, com dois estágios. O regime de fogo – semiautomático ou automático- é feito pela pressão do dedo do atirador). A BMP32 tinha cano com jaqueta de refrigeração perfurada, e usava o cartucho padrão dinamarquês cal. 9 mm Bergmann, usado nas pistolas M1910/21.

Bergmann melhorou o design em 1934, padronizando os carregadores das Schmeisser MP28 em cal. 9 mm Parabellum, cartucho padrão do exército tedesco, para facilitar a logistica e melhorando o sistema de segurança da arma. Surgindo assim a modelo MP34. Sendo logo encomendada em grande número pela Alemanha. A famosa casa Walther foi subcontratada pela Theodor Bergmann Und Co. Gmbh para fabricação desta arma.

Em 1935 a arma sofreu novos ajustes para a produção maciça, surgindo as Bergmann MP35 (a maior parte das MP35 foi usada pela Waffen-SS, embora a Wehrmacht, e a Policia alemã também a tivessem usado).

 Nesta imagem, o bravo Manoel Neto, porta uma Bergmann.

Aqui no nordeste creio que foram usadas pela polícia baiana, mas faltam documentos que atestem inequivocadamente seu uso (estaria esta MP35 dentre as duas submetralhadoras emprestadas pela Força Volante da Bahia comandada por Odilon Flor a João Bezerra? Seria esta a sua origem?).

Não nos esqueçamos que a Força Pública de Pernambuco usou também as pistolas automáticas Royal, um clone espanhol da Mauser C-96, que inovou adotando um seletor de fogo e carregador destacável. Estas pistolas metralhadoras também participaram de Angicos.


*Aurelino Fábio Carvalho Costa é baiano de Itapetinga, 49 anos, oplólogo autodidata e historiador amador, especializado em armamento leve sendo estudioso de armas de fogo e balística há mais de 29 anos. Já exerceu as funções de consultor técnico voluntário do Museu da Polícia Militar de São Paulo, e sempre batalha pela conservação da memória e da oplologia na história do Brasil.

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